Artigo publicado em 02 de junho de 2023 às 22h10
Última atualização em 03 de junho de 2023 às 04h44
Com informações da AFTR, Jornal “Diário de Petrópolis”, Jornal “Correio da Manhã”, site chinês “People Daily Online”, China News, CRRC e AFPF
Recentemente tem circulado e comenta-se nas mídias e redes sociais uma possível, merecida e muito aguardada reativação da Estrada de Ferro Mauá, a primeira ferrovia do país, além de seu prolongamento alcançando a cidade serrana de Petrópolis: era a Estrada de Ferro Príncipe do Grão-Pará. Esta última, inclusive, completou 140 anos de inauguração em fevereiro de 2023. Mas, infelizmente, tanto a última quanto a primeira foram erradicadas já a partir da década de 1960.
Há décadas diversas instituições lutam para a reativação destas ferrovias, como a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária (ABPF) e a Associação Fluminense de Preservação Ferroviária (AFPF), que contribuiu com parte das informações deste texto. Contudo, em todas as tentativas, as intenções sempre esbarravam em algum obstáculo, chegando ao ponto de, em determinada ocasião, faltar praticamente alguém pegar uma caneta e assinar um papel para as obras serem iniciadas. Infelizmente, e até hoje, tudo permaneceu apenas no planejamento e no campo dos sonhos.
Cerimônia de Assinatura de Acordo de Cooperação Técnica Rio de Janeiro – Magé – Petrópolis, em 2012.
Vídeo: Canal Arlindo Pereira no Youtube
Com todo o histórico do que ocorre e já ocorreu neste processo e nas intenções de se fazer algo ferroviário no Rio de Janeiro, tanto neste trecho citado como em outros, passamos a nos manter céticos mas ao mesmo tempo ficamos apreensivos e ansiosos pelo desenrolar da história.
Vídeo publicitário sobre o projeto da Linha 3 do metrô, já quase considerado como uma lenda.
Créditos; Canal Priscilla Cuiais no Youtube
O ceticismo não se baseia em pessimismo, mas em realismo: mesmo com tudo pronto para a reativação já ocorreu desta não sair do papel. E em outros casos também faltou capacitação técnica para elaboração e apresentação de projetos. Neste caso podemos citar o “Metrô de Macaé”, projeto que não foi adiante por diversos motivos, mas um dos principais foi a ausência de um corpo técnico para a implantação e desenvolvimento, onde os veículos chegaram sem ter nem mesmo uma ferrovia apta para circular, sem sinalização e sem estações, apesar de testes terem sido realizados. Mais detalhes podem ser vistos no artigo abaixo, publicado pela AFTR:
Projetos inadequados e suas aplicações equivocadas 4 – Metrô de Macaé
Voltando ao projeto da primeira ferrovia do Brasil e a subida da serra para Petrópolis, em uma apresentação do projeto, divulgado pela Secretaria de Transportes, pode-se perceber como a obra poderá sair do papel, a ordem e as etapas que deverão ser seguidas, vejam a galeria de imagens abaixo:
Neste atual mandato o governador Claudio Castro tem várias vezes sinalizado de forma positiva em um objetivo de se investir no transporte ferroviário, com declarações demonstrando essa intenção. E recentemente, em viagem internacional, algo de fato parece estar se concretizando…
Vídeo: Divulgação Secretaria de Transportes
Durante visita à China, o Secretário Estadual de Transportes Washington Reis gravou e publicou um vídeo declarando que estariam sendo adquiridas composições para serem utilizadas nestes trechos ferroviários citados. Isso gerou certa desconfiança e descrédito para alguns, pois os trens com tração a cremalheira (roda dentada central que auxilia os veículos a subirem e descerem rampas mais inclinadas) normalmente são fabricados na Suíça, pela mundialmente conhecida Stadler. Mas os técnicos da AFTR apontaram que isso era plausível, visto que recentemente a China iniciou a fabricação e também conta com estes veículos ferroviários diferenciados.

Como a China pode não estar tendo demanda ou mesmo saída destes veículos para a Europa, um mercado consumidor bastante considerável, direcionar sua produção para a América do Sul, em particular para o Brasil, pode ser muito interessante para a CRRC, fabricante que inclusive foi a responsável pelo fornecimento dos veículos mais atuais utilizados pelo Metrô-Rio. Ainda em relação a estes veículos nada ou muito pouco foi divulgado abertamente, mas a equipe técnica da AFTR buscou informações e acredita que possa ser este veículo mostrado abaixo:




Um editor do site chinês People’s Daily Online fez uma declaração a respeito deste veículo, logo após o seu lançamento, no final do ano passado:
“O primeiro trem ferroviário de cremalheira da China, com direitos de propriedade intelectual independentes, saiu da linha de produção da fabricante de trens CRRC Ziyang Co., Ltd. na cidade de Ziyang, província de Sichuan, sudoeste da China, em 24 de novembro de 2022. O trem foi desenvolvido pela CRRC Ziyang Co., Ltd. e seus parceiros com o apoio da CRRC Zhuzhou Locomotive Co., Ltd., também fabricante de trens, para a primeira ferrovia de cremalheira da China (ferrovia de pinhão e cremalheira), que liga Dujiangyan e a área cênica da Montanha Siguniang em Sichuan. O veículo com quatro carros, projetado para acomodar 145 passageiros, pode rodar a uma velocidade máxima de 120 km/h no trecho roda-trilho (livre aderência) e 40 km/h no trilho dentado (cremalheira). Utiliza tecnologias de ponta, como a tecnologia de direção autônoma assistida por 5G e o Sistema de Navegação por Satélite BeiDou, além de proteção automática e armazenamento com análise inteligente de dados de operação. Espera-se que a ferrovia de cremalheira que conecta Dujiangyan e a área cênica da Montanha Siguniang entre em operação total em 2026, reduzindo o tempo de viagem entre a Estação Ferroviária de Dujiangyan e a área cênica de cinco para duas horas. Estes trens são adequados para uso em rotas turísticas, em áreas montanhosas e turísticas” – Du Mingming Hongyu, editor do site chinês People’s Daily Online.
Mesmo sendo céticos mas realistas, obviamente desejamos muito que este projeto seja implementado, e as expectativas são as melhores possíveis após nós pesquisarmos pelas possibilidades apontadas e etapas do projeto percorridas.
Vídeo informativo do trem que poderá ser utilizado para a subida da serra para Petrópolis – Fonte: Divulgação CRRC
Voltando ao Brasil, de acordo com informações do jornal “Diário de Petrópolis”, o secretário de transportes anunciou que já serão iniciadas em breve as intervenções para recompor a antiga ferrovia, o que ajuda a afastar o temor de que os trens poderiam chegar sem nem ter uma ferrovia para a circulação, algo que por incrível que pareça acontece e não é incomum de ocorrer no Brasil:
“É uma obra fundamental para a mobilidade urbana, a recuperação da história, como modal de transporte e importante para o turismo. Estamos felizes em tirar do papel um projeto ousado, complexo, mas um passo considerável para Petrópolis e Magé, uma obra que a sociedade cobra há muito tempo” – afirmou Washington Reis.
Segundo membros da AFPF, instituição que incentiva este projeto, em particular, há vários anos, desta vez o sonho parece que finalmente se tornará realidade:
“Somos parte desse processo, pois o motivo fundamental da fundação da AFPF era a restauração dessa ferrovia histórica. Washington Reis e Cláudio Castro abraçaram o projeto, tirando o projeto do papel depois de tantos anos. Saber que as composições estão sendo compradas e a licitação está sendo finalizada nos deixa conscientes de que trilhamos o caminho certo, resilientes durante tanto tempo até alcançarmos nosso objetivo final” – afirma Ângela França, vice-presidente da instituição.
Antônio Pastori, também diretor da Associação Fluminense de Preservação Ferroviária, formou em 2010 o GT-Trem, Grupo de Trabalho que incluiu as prefeituras das duas cidades beneficiadas com a ligação ferroviária. Pastori apresentou, em diversas oportunidades, estudos para entes públicos mostrando a viabilidade econômica e o avanço de recuperação da ferrovia, não apenas em sua ligação entre Vila Inhomirim e Petrópolis, mas também entre Magé e o Centro da capital, em uma extensão de 49 quilômetros.
Todavia, dúvidas e questionamentos estão sendo, e tem justificativas para serem feitos, o que é natural em um projeto que podemos considerar como histórico e épico se for concretizado:
- Quem vai realizar as obras de reativação?
- Quem vai operar o sistema após concluído?
- O Governo arcará com todas as etapas do projeto, desde a reconstrução, implantação, operação e manutenção do sistema?
- Posteriormente este serviço poderá ser estendido para cidades como Duque de Caxias e Rio de Janeiro?
- Será um serviço diferenciado de transporte de passageiros, ou prioritariamente turístico?
- A bitola utilizada será como a original, métrica?
- A compra dos veículos foi realmente feita ou ainda será realizada alguma licitação?
- O valor apresentado como o investido para a implantação do projeto não é baixo para a sua magnitude?

Enquanto não temos respostas para todas estas e outras perguntas, fica a nossa promessa de originalmente trazer informações e questionamentos pertinentes, além da nossa esperança e torcida de que “agora vai”, que o projeto seja de fato concluído, mas não apenas isso: que seja planejado e implantado de forma correta e consciente, possibilitando que seja mais do que ter as ferrovias históricas reativadas, mas sim mantidas, preservadas e que possam trazer muitos benefícios à população do estado do Rio de Janeiro, berço das ferrovias Brasileiras, mas tão carente de boas notícias nesse tema.
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O texto constante neste artigo pode ou não expressar a opinião, parcialmente ou totalmente, da instituição, sendo de total responsabilidade do autor
Imagem de capa: estilização feita por Daddo Moreira de um trem da CRRC no viaduto da Grota Funda, subida para Petrópolis.