Tempo de leitura: 10 minutos
  • Categoria do evento: Expedição (Reconhecimento de trecho)
  • Data: 26 de abril de 2009
  • Objetivo cumprido: Sim
  • Participantes: Eduardo (‘Dado’)
  • Descrição da atividade: no ano de 2009 estávamos começando a reunir interessados, aficionados e pesquisadores da área de preservação ferroviária, debatendo, dialogando e trocando informações, principalmente no meio virtual (comunidades no Orkut, fóruns de debate como o TGVBR, etc.). Então, em homenagem aos 155 anos da primeira ferrovia do país (Estrada de Ferro Mauá), foi decidido realizar uma expedição de reconhecimento do trecho entre as estações de Piabetá e Guia de Pacobaíba (trecho original e pioneiro, inaugurado em 1854). Entretanto, devido a diversos desencontros, quando um podia ir o outro não poderia e assim por diante, o futuro e atual (2021) presidente da AFTR, Eduardo (‘Dado’), decidiu ir sozinho cumprir esta missão.
  • Percurso:

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· • Por um lado, uma grande inconsequência. Por outro lado, um trampolim para a AFTR • ·

  O texto a seguir será em primeira pessoa, com o próprio expedicionário narrando como ocorreu a atividade:

Manhã do dia 26 de abril de 2009. Decidido a conhecer o trecho da pioneira EF Mauá, abandonado, e sem tráfego de trens desde 1962/1982 (dependendo do trecho), e ao mesmo tempo prestar uma homenagem à grandiosa obra de Irineu Evangelista de Souza (Barão e Visconde de Mauá), arrumei uma pequena mochila, coloquei uma câmera digital que eu tinha na época (bem básica, resolução máxima de 5 megapixels para fotos e vídeo em 320×240 ou 640×480 pixels. Como o cartão de memória era de 1Gb eu só gravava em menor resolução.) embarquei em um ônibus por volta de 6h da manhã rumo à estação Dom Pedro II (Central do Brasil).

O kit era basicamente esse, mas o cartão de memória era de 1Gb.
Foto: OLX

Chegando à gare embarquei em um trem rumo à Saracuruna, município de Duque de Caxias, última parada dos trens elétricos nesta linha. Nesta estação é necessário realizar uma baldeação para o trem a diesel rumo a Vila Inhomirim, antiga Raiz da Serra, que fez parte do traçado original da EF Mauá. Gravei alguns vídeos durante o percurso e fotografei alguns detalhes externos e também dentro dos trens durante o percurso (vejam os anexos mais abaixo).

Chegando na estação de Piabetá, desembarquei e pude observar o antigo triângulo de reversão, que ligava a EF Mauá com a EF do Norte por onde o trem chegou, parcialmente encoberto por asfalto e também por construções! Um absurdo. Mas isso era apenas o começo …

Após caminhar alguns quilômetros entre Piabetá e a rodovia Rio-Magé, constatando o total abandono do leito ferroviário e até mesmo trilhos pendurados e árvores nascendo entre os dormentes, cheguei à antiga Passagem de Nível (PN). O cenário era ainda pior, pois os trilhos estão cobertos de asfalto. Do outro lado da pista começava para mim mais uma etapa, a mais difícil dessa aventura: caminhar no meio da mata, isolado de qualquer contato (o celular não tinha cobertura), sem saber o que poderia encontrar pelo caminho. Mas estava ali, não iria desistir dessa missão. E assim atravessei uma cerca de arame e segui caminhando pelos trilhos, às vezes precisando cruzar pontilhões sobre brejos com água verde correndo o risco de cair, e em outros momentos atravessando arbustos com espinhos. E sozinho. Se acontecesse algo comigo, como cair dentro do brejo, me contundir, torcer um tornozelo … o que faria? Na hora não pensei nisso, e me serviu como uma experiência tão incrível quanto arriscada, além de ter alcançado certa fama com a loucura realizada.

Caminhando por muitos minutos finalmente cheguei ao abandonado Posto Telegráfico (PT) Bongaba (que erroneamente falo Mongaba algumas vezes nos vídeos). Esta estação serviu por muitos anos, desde 1926, como cruzamento entre a EF Mauá (sentido Norte – Sul) e a Ligação Saracuruna x Visconde de Itaboraí (sentido Oeste – Leste). Bongaba a partir daquele momento tornou-se a minha estação preferida, um “point” que sempre que pude voltei para visitar e ficar por alguns minutos apreciando o entorno. O prédio da estação infelizmente está totalmente abandonado, sem uso, e depredado. Mas aquele local despertou o meu fascínio de alguma forma, talvez por ter sido o primeiro exemplo do descaso com a história, não apenas ferroviária, mas em geral, que ocorre no país, uma falta de valorização dos costumes, do passado, da memória do povo Brasileiro.

Após contemplar e registrar vários detalhes da estação, da linha e da paisagem ao redor, me despedi e continuei em frente. Eu sabia que seguindo pelos trilhos ainda existentes da EF Mauá eu iria me deparar com o Rio Caioaba, onde existia uma ponte ferroviária (levada por uma enxurrada há décadas), portanto eu teria que voltar a Bongaba. Mas mesmo assim eu decidi seguir para analisar e registrar como estava a ferrovia naquele trecho.

Vista de Bongaba. Atrás do fotógrafo a EF Mauá segue em direção ao Rio Caioaba

 

Paisagem no entorno

 

Ferrovia ou lamaçal?

 

Caminho intransitável, onde ouvi “vozes zangadas” no meio da mata!

A primeira dificuldade foi passar por uma boiada que estava pastando no leito ferroviário. Uma vaca amamentando seu bezerro não arredava as patas da minha frente, até que pouco depois liberou o meu caminho. Atravessei mais um pontilhão mal conservado e cheguei a um ponto onde a mata fechava e os trilhos estavam cobertos de lama (se ainda estão por ali). Nesse momento fiquei indeciso e dei mais alguns passos à frente, pensando se seguia ou não. Até que, durante uma fala minha por estar gravando um vídeo ouvi vozes vindas do meio da mata que diziam “Ei, eu ouvi alguém. Acho que ele está por aqui, vamos procurar!” Saí em disparada, se levei dez minutos pra ir, levei 2 minutos pra voltar, atravessei o pontilhão aos saltos, correndo sem parar e gravando tudo, o que rende até hoje boas risadas e comentários sobre a loucura que foi essa expedição.

Chegando novamente à Bongaba decidi seguir o caminho pelo atual Ramal de Guapimirim, mas os percalços não pararam por aí. Algumas centenas de metros à frente a ponte ligeiramente extensa sobre o Rio Caioaba me reservou uma surpresa: dezenas de marimbondos! Posteriormente, em outras atividades semelhantes, pude constatar que pontes ferroviárias são um abrigo costumeiro para abelhas, vespas e marimbondos. Mas naquele momento, o que eu poderia fazer? Pensei e nem registrei nada, visto que era necessária concentração para atravessar a ponte pisando nos dormentes, sem tropeçar, correr, falar, gritar nem assustar os insetos. Cobri os braços passando por dentro da camisa e peguei uma outra camisa que tinha na mochila, cobrindo meu rosto, deixando apenas olhos com óculos à mostra. Deu certo, felizmente.

Última foto em Bongaba
Indicação da quilometragem da ferrovia
Uma selfie sem ver, pois a câmera não tinha visor frontal
Uma selfie sem ver, pois a câmera não tinha visor frontal
Leito do atual ramal de Guapimirim
Leito do atual Ramal de Guapimirim

Chegando à Parada Mauá (nome dado à estrada de rodagem que cruza a ferrovia próxima à estação: Estrada Nova de Mauá), decidi seguir pelo asfalto no intuito de, assim que possível, alcançar novamente o leito ferroviário da EF Mauá. Infelizmente naquela ocasião eu não contava com GPS e nem celular com alguma função que me auxiliasse,apenas uma folha de papel impressa com uma tela do Google Maps. Acabei me perdendo, chegando a tentar alcançar o leito ferroviário quatro vezes (e em uma dessas vezes eu estava certo, mas desviei o caminho, confirmei depois) sem sucesso. Acabei alcançando o marco zero das Ferrovias Brasileiras, a estação Guia de Pacobaíba, pelas ruas dos bairros por onde passei, deixando para conhecer e registrar por onde a ferrovia passava, entre Guia de Pacobaíba e o Rio Caioaba, para as próximas oportunidades.

Cheguei quase desidratado e com insolação, mas feliz, satisfeito e com a sensação de dever cumprido.

Deixo abaixo vídeos, muitos deles inéditos, gravados durante esta verdadeira aventura que me trazem muitas lembranças e proporcionaram momentos curiosos e gratificantes. Fiquei conhecido como o “maluco da EF Mauá”, o “doido que ouve vozes na ferrovia” e o “destemido da Trilhos do Rio” (deixo esse cargo para diversas pessoas que tiveram mais coragem que eu em atividades semelhantes e até mais arriscadas).

Para finalizar, lembro de uma situação em que fui à Guia de Pacobaíba para a celebração de mais um ano de existência, um dia 30 de abril (infelizmente estes eventos tem se tornado mais um palanque eleitoral do que um balcão de soluções). Em determinado momento um guia de turismo local puxou assunto e começou a se queixar que Magé não dá valor à sua história, ao turismo ecológico e cultural etc etc. Concordei, e logo em seguida ele me solta a “pérola”:

“Tinha que ver um sujeito, maluco, que caminhou por esse trecho inteirinho, maior loucura. Só assim pra sabermos e sermos conhecidos, pra ferrovia ser divulgada”.

Olhei pro sujeito e disse que “prazer, eu sou o maluco que caminhou por esse trecho, sozinho”. Ele ficou bastante surpreso por estar falando comigo, e eu me sentindo uma celebridade … maluca, mas uma celebridade.

 

· • GALERIA DE VÍDEOS • ·

Para visualizar, clique sobre um vídeo para reproduzi-lo, são curtos e quase todos eles tem poucos segundos de duração. Para assistir o próximo, clique no botão abaixo do vídeo. O próximo vídeo será carregado, podendo ser visualizado ao clicar sobre ele, iniciando a reprodução logo acima.

 

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Saindo de casa e a caminho da estação Dom Pedro II (Central do Brasil)


 

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No trem, a caminho de Saracuruna

 


 

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Em Saracuruna, aguardando a partida do trem para Vila Inhomirim

 


 

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Caminhando entre Piabetá e Guia de Pacobaíba

 


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