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Olá, Amigas e Amigos!
O artigo abaixo não foi escrito por nenhum membro da AFTR, nos foi enviado, e achamos por bem publicá-lo, por ter um enorme valor pelas informações apresentadas. Explica de forma didática que tudo o que é dito sobre a crise de 1929 ter afetado as ferrovias brasileiras não passa de pura falácia, e muita gente embarca nessa. Mesmo o Instituto Mises, uma das mais sérias instituições do Brasil, caiu nessa. Parabéns ao cidadão que o escreveu. Vamos ao artigo: As Ferrovias Paulistas e a crise do café.

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Artigo escrito originalmente por Rafael Prudente Corrêa.

Olá, caro leitor!

Há algumas semanas, tomei conhecimento de uma matéria publicada em 2013 pela revista “Super Interessante”, cujo conteúdo trata dos problemas do transporte ferroviário no Brasil e as perspectivas futuras (disponível em http://super.abril.com.br/comportamento/por-que-o-transporte-ferroviario-e-tao-precario-no-brasil/). Ao iniciar a leitura, deparei-me com a seguinte frase nas primeiras linhas, que se referiam às mazelas que recaíram sobre as ferrovias brasileiras em sua história: “(…) outro responsável foi o café, em baixa desde os anos 1930. Ele era transportado principalmente por trens, então várias empresas férreas faliram com a falta de trabalho (…)”. Não é a primeira vez que leio ou escuto tamanho equívoco. Já se passaram quase 25 anos desde a primeira vez em que ouvi um comentário semelhante, se a memória não me falha, foi na sexta série do ensino médio durante uma aula de história, em um dos mais conceituados colégios da capital paulista. Durante uma explanação do professor sobre a história de São Paulo. Pois bem, vamos então à quebra de um paradigma, lembrando que o equívoco da matéria não está apenas em colocar o café como corresponsável pela decadência do sistema ferroviário, mas também por elevar sua importância em âmbito nacional, como se todas as ferrovias brasileiras tivessem no escoamento da produção cafeeira a razão de sua existência, desconsiderando completamente o fato de que isso se deu apenas nos estados do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e principalmente de São Paulo, sem deixar de mencionar a Estrada de Ferro São Paulo-Paraná, construída para atender e expandir a produção cafeeira no norte paranaense.

Imagem: Blog Memória de Londrina

Ainda assim, cabe ressaltar que nem todas as ferrovias construídas naqueles estados da região sudeste tiveram no café o ensejo de sua existência, tão pouco o pilar de sua sobrevivência. Sendo irrefutável o fato de que a relação entre café e ferrovia se deu com maior ênfase no Estado de São Paulo, tomarei como base a situação das três maiores ferrovias paulistas – Companhia Paulista de Estradas de Ferro, Companhia Mogiana de Estradas de Ferro e Estrada de Ferro Sorocabana – no período entre 1880 e 1950, com destaque para os anos subsequentes à crise iniciada em 1929 com a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque. Comecemos, caro leitor, por uma análise dos gráficos 1 a 3, que trazem a evolução do transporte de mercadorias e a participação do café nesta atividade:

Como se pode observar, desde o final da primeira década de existência das referidas estradas de ferro, apesar de crescente o volume do café transportado, outros gêneros concorriam para a subsistência do tráfego. Em 1880, o café era responsável por 45,11% do transporte realizado pelas três ferrovias, enquanto em 1929 atingia apenas 17,24%. Vale lembrar que os índices apontados pela Estrada de Ferro Sorocabana concorrem para a redução deste percentual, uma vez que o escoamento da produção algodoeira era a principal motivação de sua construção. Para esta, o café só veio a ganhar certa importância com o prolongamento da linha tronco até Botucatu e Bauru, entre o final do século XIX e início do século XX, e posteriormente com a inauguração da Estrada de Ferro São Paulo – Paraná, na década de 1920, cujo entroncamento se dava em Ourinhos-SP.

Primeira estação de Ourinhos, supostamente no dia de sua inauguração no ano de 1908, contando com a presença do Estado de São Paulo à época, Manuel de Albuquerque Lins. Imagem: Blog Memória Ourinhense

Uma apreciação superficial dos dados acima apresentados já é suficiente para mostrar que as referidas estradas de ferro há muito não dependiam do café. Mesmo que ele tivesse seu transporte encerrado instantaneamente após a crise, ainda lhes restaria um grande volume de tráfego, o qual se mostrou invariavelmente crescente até a década de 1940, com exceção do que se vê na Companhia Mogiana. Entretanto, chamo sua atenção para a situação do transporte do café e dos demais gêneros nos anos subsequentes a 1929.

Embarque de Café no Porto de Santos-SP

Observemos então, prezado leitor, que a demanda do transporte de café continuou crescente nos primeiros anos após a crise, ao mesmo passo em que o volume total sofreu considerável queda em 1930. No caso do café, principal atividade econômica do Estado, faz-se mister lembrar que havia grandes estoques e safras já programadas para aquele período, além de receber a máxima atenção do governo devido à sua grande importância. Entre as medidas tomadas, destacou-se a substancial redução dos fretes, contribuindo para a manutenção e crescimento do volume transportado, seja aquele comercializado ainda que a preços baixos, como aquele que seria queimado objetivando a desaceleração da queda do preço da saca. Em relação ao café em si, as ferrovias em nada sofreram com a crise que se abateu sobre este, a qual só atingira, em cheio, o produtor. Contudo, não tardaria para que outros setores sentissem o reflexo da crise, culminando na redução generalizada da atividade econômica e consequentemente da necessidade de transporte. Não obstante, em 1930, deu-se o golpe que colocou Getúlio Vargas no posto máximo da administração da federação, contribuindo para o agravamento da instabilidade que se abatera sobre a economia. Desta forma, enquanto o café sofrera uma sensível alta em seu transporte entre 1930 e 1933, os demais gêneros tiveram apreciável queda. Esta circunstância pode ser mais bem observada no gráfico 4, sobretudo em relação à Companhia Paulista e à Companhia Mogiana, principais escoadoras do café paulista.

As estatísticas até aqui apresentadas derrubam a falsa crença quanto à inexistência do que se transportar nos pós ‘crise do café’. Contudo, o leitor mais atento deve estar se perguntando: Mas qual a participação do transporte de café na renda destas ferrovias?

Pois bem, caro leitor, vamos então a este quesito, o qual não poderia ser, de forma alguma, desconsiderado.

Ao tratar desta questão, o cenário se mostra um pouco diferente. A composição das fontes de renda das referidas estradas de ferro se fazia principalmente pela soma das receitas geradas pelo transporte de mercadorias, de passageiros, de gado em pé, de bagagens e encomendas, além de outras atividades correlatas como armazenamento e terceirização de manutenção, etc.

A partir do gráfico 5, pode-se observar que a participação da receita oriunda do transporte de café, gênero de maior valor agregado, tinha maior fatia na receita total se comparada à sua participação no total transportado.

Para melhor esclarecer esta situação, façamos um comparativo entre os dados apresentados neste gráfico e o anterior. Vejamos o caso da Companhia Paulista, a maior captadora de café do estado: em 1900, o café foi responsável por 50% do tráfego de mercadorias e por 56% do faturamento total, já inclusas as receitas de todas as atividades supracitadas, enquanto em 1929, esta relação se deu, respectivamente, em 20% e 27%.

Para os mesmos anos, teve-se na Companhia Mogiana 38% e 49% (1900) e 19% e 23% (1929) e na E. F. Sorocabana 23% e 41% (1900) e 12% e 15% (1929). Como se pode observar, o café gradativamente perdeu espaço na receita à medida que outros gêneros tiveram ascensão, além do constante crescimento do volume e da receita do transporte de passageiros que se deu no mesmo período.

Tal como acontecera com o volume total transportado, o café teve participação fundamental para que a receita das referidas estradas se mantivesse em patamares razoáveis entre 1930 e 1933, dando-lhes fôlego para superar o período de instabilidade, também agravado em 1932 com a revolução constitucionalista, e voltarem a ter um bom ritmo de crescimento a partir de meados da década de 1930, como mostra o gráfico 6, já pouco dependentes do café.

Fontes:

– CPEF, Relatório para Assembleia dos Acionistas da, referentes a: 1º semestre de 1880, 2º semestre de 1880, 1890, 1900, 1910, 1920, 1929 a 1936, 1940 e 1950;

– CMEF, Relatório para Assembleia dos Acionistas da, referentes a: 1º semestre de 1880, 2º semestre de 1880, 1º semestre de 1890, 2º semestre de 1890, 1900, 1910, 1920, 1929 a 1936, 1940 e 1950;

– CUSY, Relatório para Assembleia dos Acionistas da, referente a 1900;

– EFS, Relatório para Assembleia dos Acionistas da, referentes a: 1º semestre de 1880, 2º semestre de 1880, 1º semestre de 1890 e 2º semestre de 1890;

– EFS, Relatório para Assembleia dos Acionistas da, referente a 1910;

– EFS, Relatório apresentado ao Sr. Secretário da Agricultura, Commercio, Viação e Obras Públicas, referente a 1920;

– EFS, Relatório apresentado ao Sr. Secretário da Viação e Obras Públicas, referente a 1929 a 1936, 1940 e 1950;

 

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