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Olá, Amigas e Amigos!
A proposta da AFTR, desde o início de suas postagens, foi e continua sendo a de trazer informações inéditas e exclusivas, produção e divulgação de materiais originais. Hoje, novamente, faremos isso.

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Além da história das ferrovias, mostramos em nossas postagens um pouco de cultura, filosofia, projetos e história geral. Nesta postagem, mostraremos uma história corporativa que achamos pouco provável que mesmo aqueles que estão trabalhando nesse segmento de mercado conheçam.

E, claro, ao final faremos uma comparação com a história das ferrovias de um assunto que infelizmente ainda vivemos hoje: a Guerra das Bitolas.

Lendo o título deste artigo a pergunta é inevitável: o que o tubo de PVC tem a ver com ferrovias e com a guerra das bitolas?
Sejam muito bem vindos(as) e recomendamos ler até o final.
Desejamos a todos uma excelente leitura!

 

APRESENTAÇÃO

Atualmente, em diversos fóruns ferroviários, acompanhamos discussões inócuas sobre o que é melhor: bitola larga ou estreita. Já mostramos que essa discussão é sem sentido, apresentando figuras proeminentes da Engenharia Brasileira, como Paulo de Frontin e outros, que já defendiam, há 100 anos atrás, a padronização das bitolas no Brasil em bitola métrica. Essa discussão continua hoje de forma apaixonada e irracional.

Já mostramos em diversas postagens o que foi a Guerra das Bitolas, as motivações escusas e espúrias dessa guerra de bastidores que extinguiu desnecessariamente linhas que, com pequenos investimentos, poderiam ter sido rentáveis, mas que sua erradicação causou enormes prejuízos ao Brasil. Somente nós aqui da AFTR mostramos isso, praticamente.

Engenheiro Paulo de Frontin em 1933. Foto: Blog Rio de Janeiro de Hontem

Também já mostramos que existem ferrovias em bitolas métricas, espalhadas pelo mundo, funcionando muito bem.

Hoje, mostraremos o quanto discussões apaixonadas, sem considerar nenhum aspecto técnico, podem prejudicar setores da economia.

 

O PVC

O PVC (Policloreto de Vinila), como produto, foi descoberto na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial e só foi usado na fabricação de tubos no pós-guerra. Funcionou muito bem, pois era um material com vida útil extremamente elevada e era inerte quimicamente, diferente do chumbo ou do ferro fundido, materiais usados até então na fabricação de tubos para água. Esses materiais reagiam com a água e, com o tempo, entupiam pela incrustação causada por essa reação química natural, obstruindo a tubulação. Além disso, o PVC era bem mais barato.

Fonte: Twent Brasil

Perguntem aos seus avós, que eles certamente vão lembrar disso: dos problemas que ocorriam com os entupimentos e do posterior trabalho que dava trocar a tubulação original das casas pela de PVC.

 

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HISTÓRIA DO PVC NO BRASIL

Quem trouxe o PVC para o Brasil foi a empresa Brasilit, uma empresa do grupo Saint Gobain. Quem leu nossa postagem sobre Mauá e D. Pedro II, já deve ter ouvido falar dela. Inicialmente, fabricando em São Paulo e fornecendo apenas tubos, que era algo mais fácil de fabricar.

Fonte: divulgação

Explicaremos aqui de forma rasa os processos de fabricação de tubos e conexões de PVC.

Tubos são fabricados em extrusoras, necessitando como molde apenas daquele que faz o diâmetro. É um processo contínuo, bastando ao operador apenas definir o comprimento do tubo e cortá-lo. É um processo relativamente barato, e a extrusora é um equipamento de operação mais simples.

Conexões são algo mais caro e complicado de se fabricar. São fabricadas em injetoras e precisam de moldes refrigerados. Cada conexão tem seu molde específico, que é algo bem caro e trabalhoso de se fabricar. Observem a quantidade de conexões que existem para cada tubo e percebam o quanto custa fabricar conexões de PVC.

Foto: Copafer

Por isso, inicialmente, a Brasilit incentivava seus clientes a fabricarem as conexões aquecendo os tubos. Folhetos da época mostram isso.

Os tubos de água, inicialmente fabricados pela Brasilit, eram na cor marrom e fabricados a partir das especificações europeias, especificamente as alemãs. As normas ABNT que surgiram posteriormente para normalizar a fabricação desses tubos no Brasil seguiram as normas Alemãs.

Esses tubos passaram a ser chamados no Brasil de tubo marrom soldado. Até hoje têm essa cor e são chamados assim. A concorrência copiou, e isso virou um padrão.

 

A TIGRE E SEU TUBO BRANCO

A Tigre, atual líder de mercado do segmento, surgiu pelas mãos do Sr. João Hansen Junior, fabricando produtos de plástico: pentes, leques, cachimbos e outros produtos. Em um determinado momento, o Sr. João Hansen, vendo a aceitação do PVC em São Paulo, fabricado pela Brasilit, começa a fabricar tubos em uma extrusora usada que ele tinha adquirido.

O Sr. João Hansen era um visionário e tinha diversos representantes espalhados pelo Brasil, vendendo seus produtos. Então, por um golpe de sorte e ousadia, surge algo que faria o diferencial da empresa do Sr. João Hansen, tornando-o milionário e sua empresa líder de mercado.

Fonte: Tigre

Seu representante no Rio de Janeiro, alguém cujo nome se perdeu com o tempo, sugeriu que ele fabricasse um tubo com especificações idênticas aos tubos de aço carbono usados normalmente na época, para condução de água, de forma que pudessem usar as conexões de ferro fundido e de bronze já fabricadas para esse tipo de tubo. Esse novo tubo de PVC deveria ter espessura de parede mais grossa que os fabricados pela Brasilit, de modo a se poder fazer rosca neles. Foi o famoso “Tubo Branco Rosca”. E, como argumento de vendas, diriam que o tubo fabricado inicialmente pela Brasilit era vagabundo, pois tinha uma parede fina. O bom seria o “Tubo Branco Rosca”. Além disso, o tubo branco rosca se aproveitaria da enorme gama de conexões de ferro que já existiam, conexões que, na época, em PVC, ninguém possuía.

Foto: Leroy Merlin

A partir daí, o resto é história. A Tigre se transformou de uma pequena empresa com máquinas usadas em uma potência empresarial e na maior fábrica de tubos de PVC do Brasil, tudo graças a uma sacada genial do representante do Rio de Janeiro da época e da visão do Sr. João Hansen.

Com o passar dos anos, a Brasilit resolve fabricar também o tubo branco rosca, mas quando começa a fazer isso, a Tigre já era dona de boa parte do mercado.

 

E O QUE TEM A VER A QUESTÃO DAS BITOLAS COM ISSO?

Durante anos, o Rio de Janeiro foi o maior consumidor dos tubos e conexões de PVC, branco rosca, do Brasil. Apesar de ser mais caro por consumir mais material na fabricação, engenheiros e arquitetos do Rio de Janeiro eram unânimes em dimensionar tais tubos sob a alegação de que eram “melhores”. Pessoas defendiam o tubo branco como se estivessem defendendo a própria vida. Isso lembra algo?

Foto: divulgação

Os técnicos das empresas concorrentes, apesar de mostrarem as vantagens do tubo marrom, não conseguiam romper essa barreira cultural, que se resumia a isso: uma barreira cultural. Isso também lembra algo?

A forma messiânica e apaixonada como alguns defendiam o uso do tubo branco rosca lembrava os sofistas gregos, que encontravam argumentos tirados sabe-se lá de onde, para justificar suas escolhas. Isso também lembra algo?

Eram inúmeras as discussões onde os defensores do tubo branco encontravam argumentos que só eles tinham, em defesa daquele tubo. Uma defesa apaixonada, para um assunto que deveria ser apenas técnico (troquem a palavra “tubo” por “bitola”, lembra algo?).

Fonte: On 30 Annual (Flickr)

Os olhos de alguns chegavam a brilhar nessas defesas. Certamente, alguém já viu essa cena em defensores da bitola larga.

E os anos mostraram que os técnicos estavam certos. Basta hoje ir a qualquer loja de materiais de construção e verificar que a oferta de tubos e conexões brancas é mínima.

O próprio mercado, com o tempo, constatou que o tubo marrom, além de mais barato, é mais eficiente e mais prático de ser instalado. Só tem vantagens, mas isso levou mais de 40 anos para ser aceito.

No caso das bitolas, ainda não chegamos lá, mas temos esperança de que toda essa magia envolvendo a bitola larga acabe e o bom senso prevaleça.

 

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Até a próxima!

A opinião constante neste artigo pode expressar, ou não, totalmente ou parcialmente, a opinião da instituição, sendo de inteira responsabilidade de seu autor.

Foto de capa: Divulgação

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Autor

  • Mozart Fernando

    Engenheiro Mecânico formado pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral da AFTR no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de diretor-técnico da instituição. Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966. Esse Engenheiro durante esse período trabalhando no setor de cremalheiras acompanhou o desmonte da E.F. Cantagalo e conhecia diversas histórias envolvendo o desmonte da Ferrovia de Petrópolis realizado pela mesma equipe. Histórias que muitos preferem esquecer. Parte dessa convivência extremamente valiosa está transcrita nos textos publicados pela AFTR. Não se considera um “especialista” em ferrovias, outra palavra que hoje no Brasil mais desmerece do que acrescenta. Se considera um “Homem de Negócios” e entende que o setor ferroviário só terá chance de se alavancar quando os responsáveis por ele também forem homens de negócios. Diferente de rodovias, as ferrovias são negócios. E usar para ferrovias os mesmos parâmetros balizares de construção e projeto usados em rodovias redundará em fracasso. Mozart Rosa é alguém que mais que projetos, quer apresentar Planos de Negócios para o setor.

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