Tempo de leitura: 5 minutos

Por Mozart Rosa

Dando continuidade a uma série de textos de cunho eminentemente técnico, iremos explicar os prováveis motivos da queda do setor como um todo, ao longo de anos. Tentaremos assim esclarecer diversos pontos que até hoje são debatidos mas por vezes equivocadamente divulgados e defendidos, e assim demolir uma série de mitos.
Boa Leitura a todos.

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02: O papel importante das locomotivas nessa derrocada.

Quando as ferrovias começaram todos sabemos que se utilizavam maquinas a vapor. A potencia dessas maquinas nunca era superior a 500HP (Horse Power = Cavalos de potência). Com a mudança para a tração a Diesel passamos aqui no Brasil a usar locomotivas que já partiam de 1300HP de potência. Acontece que transportando em essência as mesmas cargas dos antigos trens a vapor.

Trem de carga da EFCB, com tração a vapor – Fonte: internet

Vamos transportar isso para o cotidiano. Quanto consome um antigo Chevrolet Opala e o quanto consome um carro popular? Ao fazer a mudança do vapor para o diesel ficou evidente, por conta do consumo das locomotivas a diesel, o custo do combustível. E que assim algumas cargas tornavam-se extremamente deficitárias. Ao focar em graneis as locomotivas foram padronizadas para equipamentos com motores de elevada potência, sempre acima de 1300HP. Isso fez com que ao longo do tempo o transporte de vários tipos de carga fossem descontinuados por conta dos prejuízos que provocava, como por exemplo:

  • Carga Geral;
  • Laticínios;
  • Carga Viva;
  • Passageiros.

A EFCB/RFFSA, vendo os polpudos lucros advindo dos contratos de transporte de minério, padronizou suas locomotivas para locomotivas de grande capacidade específicas para o transporte de graneis.

Locomotiva GE 1201 da RFFSA transportando minério (Fonte: Benício Guimarães via AENFER/AFTR)

Acontece que esse lucro substancial não conseguia cobrir o prejuízo causado pelas outras operações de transporte nem cobrir o custo da maquina administrativa da EFCB/RFFSA, o que gerou a guerra das bitolas. Mas isso já é assunto para outra postagem.
Houve ali um enorme erro de planejamento pois, ao padronizar as locomotivas visando graneis, se colocou em segundo plano cargas que poderiam ser lucrativas usando-se locomotivas adequadas. Para quem acredita em Teoria da Conspiração a descontinuidade dessas cargas nada teve a ver com o transporte por caminhões, ou com os empresários de ônibus no caso do transporte de passageiros. Simplesmente os prejuízos no transporte por trem eram monumentais.
Para transportar carga geral e carga viva não seriam necessárias locomotivas potentes como as lendárias Alco, G-12 ou U-20, locomotivas usadas pela Central do Brasil e posteriormente pela RFFSA fabricadas para tracionar graneis.

Locomotiva GE U12B 2306 tracionando o lendário trem de passageiros Cacique (Rio de Janeiro x Campos dos Goytacazes) passando na altura do Maracanã
(Foto: Benício Guimarães via AENFER/AFTR)

Poderíamos no Brasil focar em empresas ferroviárias regionais transportando cargas e passageiros usando composições com motores de 440HP de potência, que são motores semelhantes aos usados nos ônibus de dois andares “DD” (Double Decker). Nos Estados Unidos essas empresas ferroviárias são chamadas de Short Lines.

A Western Virginia Central é um exemplo de ferrovia Short Line que opera nos EUA: atualmente opera trens turísticos e também trens de carga atendendo empresas madeireiras, de carvão, curtumes e outras empresas locais, mantendo conexão com outras ferrovias.

A Associação Ferroviária Trilhos do Rio – AFTR é a única instituição, ligada a preservação e projetos ferroviários, que tem prontos e aprovados, por um fabricante de material rodante, projetos de veículos de carga montados a partir da estrutura de VLTs a Diesel com 6 vagões para transporte desse tipo de carga. Com capacidade volumétrica por vagão fechado e adaptado para cargas paletizadas de 28 Metros Cúbicos, na prática significa colocar a carga de 6 carretas em um único trem, e esses veículos ainda podem tracionar algumas pranchas com Contêineres.

Pensar em pequenas ferrovias regionais para transporte de cargas tendo em mente o uso de grandes locomotivas a diesel como as citadas no início do texto é condenar o projeto ao fracasso, e ter a certeza de que jamais vão sair do papel.

 

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Autor

  • Mozart Fernando

    Engenheiro Mecânico formado pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral da AFTR no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de diretor-técnico da instituição. Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966. Esse Engenheiro durante esse período trabalhando no setor de cremalheiras acompanhou o desmonte da E.F. Cantagalo e conhecia diversas histórias envolvendo o desmonte da Ferrovia de Petrópolis realizado pela mesma equipe. Histórias que muitos preferem esquecer. Parte dessa convivência extremamente valiosa está transcrita nos textos publicados pela AFTR. Não se considera um “especialista” em ferrovias, outra palavra que hoje no Brasil mais desmerece do que acrescenta. Se considera um “Homem de Negócios” e entende que o setor ferroviário só terá chance de se alavancar quando os responsáveis por ele também forem homens de negócios. Diferente de rodovias, as ferrovias são negócios. E usar para ferrovias os mesmos parâmetros balizares de construção e projeto usados em rodovias redundará em fracasso. Mozart Rosa é alguém que mais que projetos, quer apresentar Planos de Negócios para o setor.

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