Tempo de leitura: 8 minutos

Por Mozart Rosa


Artigo publicado originalmente em 21 de julho de 2020 às 12h
Republicação do texto em 23 de junho de 2023 às 11h55
Última atualização em 23 de junho de 2023 às 9h26

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A Breve Historia Moderna da Bitola Métrica nas linhas operadas pela Supervia. Sugestões resumidas para a revitalização.

(Nosso foco aqui é o período pós 1974. O período pré 1974 é de conhecimento publico.)

Quando o Coronel Weber assume a presidência da RFFSA com objetivo de colocar ordem na casa, provavelmente por boa fé, se cerca de alguns çábios da engenharia ferroviária que na ocasião lhe apresentaram mais problemas que soluções.

Uma das “péssimas ideias geniais” apresentadas e levadas adiante foi a transformação das linhas de bitola métrica em ferrovia “padrão E.F.C.B.” e prolongar a linha até Petrópolis, o que já na época era um anseio da população Petropolitana e desde sempre foi um ramal de operação viável economicamente, mas extinto por razões até hoje mal explicadas.

Viaduto da Grota Funda (original) na subida da Serra da Estrela em direção a Petrópolis, em 1898
Fonte: Brasiliana Fotográfica

Algumas informações complementares:

  • O Coronel era um oficial respeitado e competente, coronel de engenharia, tendo deixado um legado pelas localidades por onde passou em sua trajetória militar. Mas nada entendia de ferrovias, e lamentavelmente se cercou de gente de competência bem duvidosa em sua gestão na RFFSA. Mesmo assim até hoje ainda é lembrado por várias iniciativas tomadas à frente da Companhia.
  • Ferrovias “padrão E.F.C.B.” seriam ferrovias de bitola Larga e eletrificadas. Esse conceito se cristalizou nos corações e mentes de profissionais da RFFSA egressos da E.F.C.B. por conta da ineficiência e dos prejuízos na operação dos trens de Bitola Métrica, em específico os da E. F. Leopoldina, prejuízos estes que eram reversíveis mas preferiu-se extinguir ou abandonar do que manter e modernizar.

Vista aérea da estação Barão de Mauá e Alfredo Maia em 1930. Todas as linhas são em bitola métrica, uma gigantesca malha que ligava a capital do estado ao interior e Norte Fluminense, extinta paulatinamente no decorrer dos anos.
Foto: Brasiliana Fotrográfica

A partir de então se iniciam as obras para essa adequação. Inicialmente se constrói o trecho em bitola larga, e eletrificação do mesmo, ligando Gramacho a Saracuruna, A estação Vila Inhomirim na época sofreu uma profunda reforma visando prepara-la para receber os futuros trens de Petrópolis, mas como sempre acontece em obras públicas o dinheiro acabou, e a obra parou em Saracuruna, nunca sendo retomada.

Estação Vila Inhomirim. À direita a rampa da subida da serra em direção a Petrópolis
Fonte: Reddit

Se cria com isso uma das maiores aberrações de mobilidade urbana existentes no Brasil, uma ideia de jerico com o perdão da palavra, e levada as ultimas consequências. Duas baldeações em um trecho sem características para isso, algo que jamais deveria ter sido feito: um provisório que virou permanente (segundo funcionários da época isso causou uma brutal diminuição do número de passageiros no trecho).

Esse absurdo gerou uma serie de problemas operacionais para a então RFFSA:

  • A subestação elétrica prevista para o ramal nunca foi construída, sobrecarregando com essa operação o trecho Gramacho x Saracuruna, e o próprio ramal de Gramacho, situação que provavelmente permanece até hoje;
  • Nunca foram construídas em Saracuruna as oficinas que deveriam servir a esse trecho, gerando a esdrúxula situação em que as locomotivas que necessitam de manutenção mais complexa precisam ser levadas em carretas para as oficinas da Supervia em Deodoro. Cabe dizer que anteriormente os equipamentos eram levados para manutenção leve nas oficinas de Triagem, mas por outra ação leviana ou de interesses escusos os trilhos das linhas de bitola métrica de todo o trecho Saracuruna x São Cristóvão foram removidos, impossibilitando assim os trens acessarem as oficinas pelos trilhos;
  • Nunca foi feita também a duplicação que possibilitaria aumentar a quantidade de composições na via permitindo mais horários, além de possibilitar a operação do trem para Petrópolis, previsto na ocasião.
  • Além disso a operação desse ramal repetia os erros cometidos pela RFFSA ao longo de sua historia no transporte de passageiros em trechos não eletrificados. Com o uso de locomotivas de elevada potência e inadequadas para esse tipo de operação, o consumo elevado de combustível reduziu qualquer chance de lucro, dando uma péssima fama a operação ferroviária de transporte de passageiros de media e longa distância. E a Supervia herdou toda essa lambança.

Pátio da estação de Saracuruna. As linhas ao fundo em bitola métrica vão em direção a Vila Inhomirim e Guapimirim (Norte-Fluminense antigamente). à direita um galpão onde ocorrem a guarda, manutenções leves e sucateamento de locomotivas.
Foto: Eduardo (‘Dado’) em 2009

E as coisas pra variar só pioraram: em determinado momento a Central Logística, incapaz de operar o ramal de Guapimirim ou qualquer outro, o repassou a Supervia. Um autêntico presente de Grego, nas condições que o trecho foi entregue …

Tudo isso deixou para a Supervia um fardo difícil de carregar. Não existe a menor chance da mesma, uma empresa focada em grandes volumes de passageiros, operar condignamente os ramais de bitolinha. Essa operação só se torna viável por uma subsidiaria da própria Supervia ou outra empresa com foco nesse mercado, cobrando uma tarifa calculada pela composição de custos especifica desse ramal, e não transpondo para o trecho a Diesel a estrutura de custos do ramal elétrico.

Trens de bitola métrica da Supervia em 2015
Foto: Eduardo (‘Dado’)

A Solução possível

A solução para esse imbróglio operacional passa pelo retorno da Bitola métrica em sua plenitude retornando inicialmente até a estação Gramacho ou Duque de Caxias a princípio, concomitante a operação de trens elétricos no trecho, que é pouco rentável por conta das características locais. As composições, em bitola métrica e operando com tração a diesel, devem ter motores adequados ao volume previsto do trecho, com a concessão sendo estendida inicialmente até Petrópolis, dando assim viabilidade econômica, algo que não acontece desde a década de 60.

A estação da Penha poderá ser uma candidata a um novo terminal dos trens em bitola métrica, com integração ao BRT, em uma futura revitalização do trecho. Na foto a estação em 2009, com espaço para duas linhas em bitola métrica e plataforma específica e separada dos trens elétricos.
A linha em bitola métrica na imagem, à época em bom estado, foi removida pouco tempo depois e não mais existe em todo o trecho.

Foto: Eduardo (‘Dado’)

Abaixo alguns links que tentam explicar o motivo de alguns fracassos do setor ferroviário brasileiro. Os textos destes links têm um estilo misturando pé na porta e informações rasas, pois pretende-se ser uma leitura rápida não apenas para leigos, mas também para profissionais da área trazendo à tona informações já há muito esquecidas e bem esclarecedoras.

Agradecemos a atenção e leitura. Até a próxima!

 

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Agradecemos a leitura! Até a próxima!

 

O texto deste artigo pode refletir, ou não, parcialmente ou totalmente, a opinião da instituição, sendo de inteira responsabilidade do autor.

Foto destacada: Estação Suruí em 2010. Foto: Julio Cesar

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Autor

  • Mozart Fernando

    Engenheiro Mecânico formado pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral da AFTR no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de diretor-técnico da instituição. Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966. Esse Engenheiro durante esse período trabalhando no setor de cremalheiras acompanhou o desmonte da E.F. Cantagalo e conhecia diversas histórias envolvendo o desmonte da Ferrovia de Petrópolis realizado pela mesma equipe. Histórias que muitos preferem esquecer. Parte dessa convivência extremamente valiosa está transcrita nos textos publicados pela AFTR. Não se considera um “especialista” em ferrovias, outra palavra que hoje no Brasil mais desmerece do que acrescenta. Se considera um “Homem de Negócios” e entende que o setor ferroviário só terá chance de se alavancar quando os responsáveis por ele também forem homens de negócios. Diferente de rodovias, as ferrovias são negócios. E usar para ferrovias os mesmos parâmetros balizares de construção e projeto usados em rodovias redundará em fracasso. Mozart Rosa é alguém que mais que projetos, quer apresentar Planos de Negócios para o setor.

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