Tempo de leitura: 12 minutos

Por Mozart Rosa

As atuais leis que regem o setor ferroviários são de 1998, e apesar de melhoraram um pouco a situação do setor, possibilitando a constituição de diversas empresas hoje vitoriosas, continuam travando o desenvolvimento do setor mantendo-o engessado.

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Com o objetivo de colaborar, a AFTR desenvolveu algumas propostas para o setor, que precisa de uma mudança radical em sua legislação de modo a incentivar a entrada de novos concessionários.

Não somos advogados. Somos um grupo de profissionais, dentre estes, alguns engenheiros, e nos desculpem por eventuais erros jurídicos em nossa proposta. Mas pelo menos estamos apresentando propostas, algo que muitos nunca fazem ou fizeram.

Antes de apresentarmos a Lei dos Pontos, algo novo e que pode ser revolucionário, mostramos abaixo alguns pontos  e medidas cruciais que precisam ser alteradas em relação à legislação vigente e em relação a outros fatores, e que possibilite em seguida a adoção de medidas que liberem e incentivem investimentos, alavancando todo o setor. Além da Lei dos Pontos, que será esmiuçada no nosso próximo artigo, mostramos uma série de iniciativas que podem, e devem ser tomadas, o quanto antes.


PROPOSTAS ADMINISTRATIVAS E LEGISLATIVAS PARA O SETOR FERROVIÁRIO

Prolegômenos

Hoje, no século XXI, o povo brasileiro está revivendo uma situação já vivida no século XX, e poucos se dão conta disso. Nossa empresa pública, a bola problemática da vez e que é protegida pela lei do monopólio, presta um péssimo serviço à população, conhecido por Correios. Empresa que provavelmente em algum momento será privatizada. Não sabemos quais instrumentos jurídicos serão usados, mas certamente ela terminará a década bem menor do que é hoje, se é que continuará existindo.

No século passado o grande problema do Brasil, o desastre do momento, era a RFFSA. Atingiu tal gigantismo, incompatível com a realidade de sua época, que precisou ser extinta. Era indomável, incontrolável, acumulava prejuízos monumentais, com funcionários em excesso que se apinhavam nos corredores de sua sede no Rio de Janeiro e pelo Brasil, com despesas extraordinárias, ou seja, um serviço péssimo.

O Carro-Correio/Chefe do Trem, da EF Oeste de Minas
Fonte: Minas Train

Sob a alegação de prestar um serviço de interesse nacional tudo lhe era permitido, não existiam limites. Os balanços mostravam a triste realidade.

Sim estamos falando da RFFSA, e não dos Correios. Mas as descrições feitas à época caem como uma luva para a situação atual. A solução encontrada foi o desmantelamento da RFFSA, através da concessão de sua malha pelo Governo Federal, como forma de se livrar de um grande problema. O resultado disso foi a constituição de novas empresas concessionarias operando parte das malhas da RFFSA, empresas saudáveis pagadoras de impostos, pagadoras de outorga, geradoras de empregos e de riquezas.

· • Fazendo o que o estado, pelas suas características, é incompetente em fazer • ·

Lembrando que quem criou esse conceito e essa legislação foi o nosso malvado favorito: Getúlio Vargas. Ao aludir a temas como segurança nacional, defesa de setores estratégicos e defesa do cidadão, enganou todo mundo e criou cabides monstruosos de empregos.

Trem transportando semirreboques de carretas da FedEx, empresa de logística de transporte de encomendas nos EUA
Foto: FedEx

Aquele país bem ao norte, ainda a maior economia do mundo, aquele país que muitos criticam, mas que todos fazem questão de visitar sempre que podem, tem:

  • Diversas companhias ferroviárias;
  • Diversas empresas de entrega de encomenda;
  • Diversas empresas de petróleo.

Portanto quando escutar alguém defendendo monopólios, pense nisso.

Acontece, que ao desmantelar a RFFSA, tudo foi feito de forma açodada, sem planejamento ou preocupação com o futuro, sem a preocupação com o famoso Day After, o dia seguinte como se não existisse um amanhã, era preciso de forma urgente se livrar do problema.

Locomotiva GE2033 próxima a Três Rios, em 19 de março de 1992
Fonte: Arquivo Pessoal Benício Guimarães (AENFER/AFTR/Trem de Dados)

Na pressa, muitas pontas soltas foram deixadas. Principalmente em relação a legislação. Como sempre a AFTR pensando como arquiteto que pensa no todo e não como engenheiro que pensa no fragmento, apresenta soluções para algo até agora menosprezado pelo governo.


A legislação

É algo fundamental para um planejamento futuro do setor, dando segurança jurídica a novos investidores.

Pretendemos com isso, fazendo parte de nosso conjunto de propostas, trazer para o mercado novas concessionarias, de todos os tamanhos, afinal o mercado tem espaço para todos. De empresas bilionárias como Rumo e MRS, a empresas pequenas com potencial de crescimento, como as capacitadas a operar Ônibus de Linha e Caminhões de Linha. Concessionarias de Multicargas e Passageiros.

· • Clique aqui e leia o nosso artigo sobre o aproveitamento de ferrovias abandonadas • ·

A AFTR, ao longo do tempo, vem fazendo um trabalho de mostrar os erros e apontar as suas soluções para o fomento do setor. E aqui novamente faremos isso, sendo que dessa vez faremos propostas de cunho administrativo e legal, de modo a facilitar a vida dos que quiserem iniciar investimentos no setor, e facilitar a vida dos que já estão. Sabemos que são propostas que até podem ser utópicas, afinal quem está no governo controlando o setor fará de tudo para manter o poder e manter tudo como está, mas estamos fazendo a nossa parte.

· • Se o marxismo, utopia por excelência e que nunca funcionou, encontra inúmeros defensores, por que então nós com propostas viáveis não podemos sonhar? • ·


A Super F

Esse nome surgiu ao acaso, não significa nada, mas representa muita coisa, por favor sugiram um nome mais bonito.

De acordo com nossa proposta a Super F seria uma autarquia, um departamento, uma superintendência, qualquer coisa, mas um órgão federal que congregasse tudo relativo às ferrovias do Brasil.

  • Do planejamento;
  • Da gestão patrimonial;
  • Da gestão da PFF;
  • Do incentivo a entrada de novos concessionários no setor tanto para transporte de cargas como principalmente para passageiros;
  • Do apoio as instituições ligadas a preservação ferroviária como a ABPF, entre várias outras extremamente competentes;
  • Do envio de legislação específica sobre o tema para aprovação e debate no legislativo.

Uma instituição responsável pelo setor, ocupando o espaço que deveria ter sido da RFFSA, como empresa de planejamento e gestão, e jamais a operadora fracassada que foi. Uma instituição ocupando o vácuo criado com a extinção da RFFSA, e resolvendo a infinidade de problemas criados por conta desse vácuo.

Locomotiva GE U8B nº 2140 em Alagoinhas-BA no ano de 1994
Fonte: Arquivo Pessoal Benício Guimarães (AENFER/AFTR/Trem de Dados)

Uma instituição que gerisse o Sistema Ferroviário Nacional (esse sim um nome bonito e pomposo) do qual fará parte todo o patrimônio ferroviário nacional em uso ou não, e todas as concessionarias existentes, e que venham a ser constituídas. Fazendo parte desse Sistema diversos órgãos e instituições gerenciadores do setor.

· • NÃO deve ser em nada parecido com uma agência reguladora • ·

Seria:

  • Uma agência de fomento do setor;
  • Intermediadora de conflitos;
  • Gestora de patrimônio;
  • Promotora de eventos culturais ligados ao setor;
  • Centro de debates sobre o setor, sempre visando sua proteção e ampliação;
  • Um local que receberia de braços abertos, com um café quente (e claro que também com um pão de queijo), todo investidor de qualquer tamanho interessado em investir no setor.

Mas quem está acostumado a regras, controles, intervenções, maracutaias, não estará preparado para ter essa conversa.

Vão fazer parte da Super F os seguintes departamentos e ela controlará as seguintes instituições:

• DGF – Departamento de Gestão Ferroviária
Órgão de Gestão Patrimonial.

Hoje o patrimônio ferroviário esta parte sob responsabilidade do SPU – Serviço de Patrimônio da União, e parte sob a jurisdição do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Estação de Ribeirão Vermelho-MG em 1988
Fonte: Arquivo Pessoal Benício Guimarães (AENFER/AFTR/Trem de Dados)

Alguém tem ideia da complicação que é isso? Tudo que pertence ao estado e que não tem quem efetivamente controle não é de ninguém.

É preciso um órgão próprio controlando e gerindo todo esse patrimônio.

• PFF – Polícia Ferroviária Federal
Fundamental para garantir a segurança das cargas de maior valor agregado, e os trens regionais de passageiros.

· • Leia mais sobre o assunto no nosso artigo sobre a PFF • ·

Os primórdios da Polícia Ferroviária
Fonte: Divulgação

• Tribunal Arbitral Ferroviário
Em 23 de setembro de 1996 foi aprovada a LEI Nº 9.307 que trata da criação da figura dos árbitros na gestão de conflitos jurídicos, não passando pelo judiciário. Sob supervisão do órgão gestor do sistema, pode-se criar tribunais arbitrais para solucionar de forma rápida litígios do setor.

• Conselho Consultivo das Ferrovias
Órgão colegiado com membros de todas as concessionárias. Terá como missão resolver conflitos e planejar o futuro do setor. Desse conselho farão parte, além de funcionários das concessionárias, representantes do Exército e de empresas de telecomunicações. Grandes parceiras, no uso do subsolo das linhas férreas.

• Departamento Cultural
Desse departamento serão convidadas a fazer parte todas as instituições Brasileiras dedicadas a preservação das ferrovias, de seu patrimônio histórico, de seus bens históricos, moveis e imóveis. Instituições como ABPF, Circuito Ferroviário Vale Verde, Museu Ferroviário Paulista e muitos outros, a quem agradecemos o trabalho realizado ao longo do tempo, mantendo viva a memória de um Brasil que deu certo.

A Super F, deve ser um órgão com menos de 500 pessoas, excluindo o efetivo da PFF, que assim conseguirá dar conta do recado, gerenciado todo um setor da economia.

Exposição de fotos e painéis na Estação Barão de Mauá (Leopoldina) em 2017
Fonte: Suprimida

E a Estação Leopoldina, pelo que representa, seria o local ideal para sediar esse órgão.


Propostas de Legislação Específica Para o Setor

Caso esse ou qualquer outro governo queira efetivamente fomentar o setor, inicialmente precisará nomear alguém com conhecimento de causa.

· • Se não conhecer, que pelo menos estude e aprenda • ·

Ler o material publicado pela AFTR já é um grande passo. 😉

O vácuo político e de poder, criado com a extinção da RFFSA, criou um caos. Um segmento sem lei, o autêntico Faroeste Caboclo. Estados e municípios passaram a criar legislações esdrúxulas e coercitivas.

Prefeitura interdita (?) ferrovia em Mangaratiba
Fonte: Prefeitura, rede social

Já mostramos em outras postagens municípios que multam concessionários por buzinar, outras por passar suas composições na madrugada, outros conseguindo liminares para remoção de trilhos no perímetro urbano, ainda veremos concessionarias serem multadas por existir.

· • Nada disso existe no setor rodoviário • ·

Existem rodovias federais e estaduais, e aqui no estado do Rio de Janeiro temos várias passando dentro de municípios, e não se vê movimentos visando proibir motoristas de buzinarem ou juízes concedendo liminares proibindo o tráfego de veículos a noite ou os proibindo de buzinar. Qual o motivo dessas bizarrices acontecerem com o setor ferroviário?

Fonte: Diário do Rio Claro

Muito estranho, prefeitos de alguns municípios posando de vítima na imprensa e reclamando de as concessionárias ferroviárias não pagarem as multas milionárias aplicadas por eles, explique quem puder o motivo disso não acontecer com as rodovias. E quem deu a eles tal poder?

Deve o governo federal definir por leis rigorosas e bem escritas que ele, e apenas ele, será responsável pela legislação inerente às ferrovias, impedindo situações como essas. Muitos ouvem o termo segurança jurídica e não entendem.

· • Regulamentar essa balbúrdia é SEGURANÇA JURÍDICA • ·

Sugerimos que a base para criação dessa instituição seja a ANTF – Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, associação que defende os interesses das maiores concessionarias de carga existente no setor. E daquelas que certamente ainda serão criadas.

Será a gestão do setor na mão do governo em parceria com os empresários: mais uma novidade proposta pela AFTR. Uma relação intrínseca Governo x Empresários formulando políticas e solucionando conflitos.

Não perca, em breve, a segunda parte desse artigo sobre a Lei dos Pontos. Muita coisa vem por aí, aguardem !

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Agradecemos a leitura. Até a próxima !

Imagem em destaque: uma luz no fim do túnel. Foto: Eduardo (‘Dado’) em 2018.
(A opinião constante deste artigo é de inteira responsabilidade do autor, não sendo, necessariamente ou totalmente, a posição e opinião da Associação)

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Autor

  • Mozart Fernando

    Engenheiro Mecânico formado pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral da AFTR no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de diretor-técnico da instituição. Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966. Esse Engenheiro durante esse período trabalhando no setor de cremalheiras acompanhou o desmonte da E.F. Cantagalo e conhecia diversas histórias envolvendo o desmonte da Ferrovia de Petrópolis realizado pela mesma equipe. Histórias que muitos preferem esquecer. Parte dessa convivência extremamente valiosa está transcrita nos textos publicados pela AFTR. Não se considera um “especialista” em ferrovias, outra palavra que hoje no Brasil mais desmerece do que acrescenta. Se considera um “Homem de Negócios” e entende que o setor ferroviário só terá chance de se alavancar quando os responsáveis por ele também forem homens de negócios. Diferente de rodovias, as ferrovias são negócios. E usar para ferrovias os mesmos parâmetros balizares de construção e projeto usados em rodovias redundará em fracasso. Mozart Rosa é alguém que mais que projetos, quer apresentar Planos de Negócios para o setor.

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