Olá, Amigas a Amigos.
Hoje veremos como é lamentável a miopia dos nossos formuladores de políticas públicas em diversos aspectos, e infelizmente acaba estendendo-se a muitos setores de nossa sociedade. A logística é uma delas, e no texto abaixo mostraremos os motivos disso.
Sejam muito bem vindos a mais um artigo da AF Trilhos do Rio.
Agradecemos a visita e desejamos a todos uma excelente leitura!
LOGÍSTICA NO RIO DE JANEIRO, POR QUE É TÃO RUIM?
FALTA DE INTEGRAÇÃO COM MINAS GERAIS
O estado do Rio de Janeiro é vizinho de Minas Gerais, um estado sem saída para o mar, com área territorial de 586.521,123 km2, um pouco maior que a área da Espanha, que é de 506.030 km². Por que então não existem projetos logísticos em nosso estado que contemplem uma integração logística com o estado de Minas Gerais, oferecendo nossos portos para escoamento da produção mineira?
Nossos governantes, ao formularem políticas para a área de logística, se comportam como se Minas Gerais não existisse, e isso é muito ruim, pois se entendessem isso conseguiriam trazer emprego e renda para a população tanto do Rio de Janeiro quanto Minas Gerais.
Vejam o quadro abaixo:
Localidade | Distância (Aproximada) | |
Leopoldina | Porto do Rio de Janeiro | 250 km |
Leopoldina | Porto de Santos | 650 km |
Qual a lógica do produtor de café e de outros produtos da zona da mata mineira, nos municípios do entorno de Leopoldina (como Muriaé, Carangola, Ponte Nova, Viçosa, Ubá, Cataguases, Além Paraíba) transportarem sua produção de café e de outros produtos até Santos-SP para exportação, podendo transportá-lo para algum porto do Rio de Janeiro? Viram a distância?
O Sr. Ruy Barreto, já falecido, que foi durante anos o maior exportador de café do Rio de Janeiro, fazia a mesma pergunta. Ganhou muito dinheiro trazendo café para exportação pelo porto do Rio de Janeiro, pelos trilhos da E.F. Leopoldina. Inclusive, usando os trilhos da antiga E.F. Cantagalo.
Essa história é contada em detalhes em nossa postagem abaixo:
A ORIGEM DA E.F. LEOPOLDINA
A E.F. Leopoldina surge a partir do interesse de produtores de café da zona da mata em trazer esse produto destinado à exportação para o porto do Rio de Janeiro, o que naquela ocasião já era possível por navio ou por ferrovia, via Porto Novo do Cunha, cidade posteriormente rebatizada de Além Paraíba, sendo que era mais rápido por ferrovia do que por navio.
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Já existia a E.F. Melhoramentos, uma ferrovia construída por Paulo de Frontin que ligava aquela localidade ao Rio de Janeiro, passando por Três Rios, Paty do Alferes, Miguel Pereira e Japeri. Para isso, construíram a E.F. Leopoldina, que inicialmente atendia Cataguases, e com o tempo passou a atender diversos municípios daquela região e cujos trilhos se encontravam com os da E.F. Melhoramentos em Porto Novo do Cunha.
Começou ali uma prática que posteriormente passou a ser chamada de “Direito de Passagem”, onde uma empresa utiliza a via permanente de outra, prolongando assim seu alcance. Como isso funcionava não sabemos, mas o que sabemos é que existiu esse acordo entre essas empresas. Posteriormente, a E.F. Central do Brasil incorporou a E.F. Melhoramentos, a renomeando para Linha Auxiliar.
Abaixo um mapa da E.F. Leopoldina em 1898. Observem sua ligação com Além Paraíba.
A CÂMARA DE COMPENSAÇÃO
Citamos ferrovias constituídas há mais de 100 anos. Quais instrumentos elas usavam para reembolsar essa parceria que existia? Como já dito, não sabemos. No entanto, a partir da tecnologia do século XXI, elaboramos uma ideia que pode servir para reembolsar a interconexão de ferrovias: a câmara de compensação.
Existem hoje em diversas lojas de roupas os alarmes passivos, onde ao passar com eles por um detector eletrônico, o alarme faz disparar um sensor. Isso é muito usado para coibir furtos.
Baseado nessa premissa, poderíamos colocar em cada vagão um alarme desses, e no início e final da via permanente da outra companhia, um sensor que identificaria a passagem desse vagão. Essa passagem detectada seria enviada para uma central que emitiria uma cobrança em função do número de vagões que passassem pela via e encaminharia essa cobrança para essa câmara de compensação. Seria como o pagamento de pedágio.
Ao final de um período, seria computado o quanto cada empresa usou da via permanente da outra e quantas vezes. E mediante um valor previamente arbitrado entre as partes, seria feita a cobrança para a empresa devedora por custo de passagem por vagão.
Essa é apenas uma ideia; podem existir outras, mas sempre um acordo entre as partes, sem a participação ou a presença do estado.
OS MEGAPROJETOS
Qual é o objetivo dos megaprojetos? Por que não autorizar e incentivar empresas regionais a construírem pequenas linhas, para que essas linhas possam, futuramente, ser interligadas e os empresários negociem entre si o direito de passagem? Assim como no início do século, quando se negociou o direito de passagem entre a E.F. Melhoramentos e a E.F. Leopoldina, que posteriormente se tornou uma das maiores ferrovias do Brasil.
Incentivar os empresários a construírem pequenas ferrovias de uso misto, transportando inclusive lixo, em bitola métrica, que tem custos de construção bem menores que os da bitola larga e também permitem uma elevada capacidade de transporte, como visto na E.F. Vitória-Minas. Essa pode ser a solução para restaurar as ferrovias no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.
A Ferrovia Centro Sul Fluminense, proposta por nós, que construída poderia fazer parte desse sistema. Vejam abaixo os link para estes textos:
INTEGRAÇÃO COM O ESTADO DE GOIÁS
Temos aqui ao lado nosso vizinho com área um pouco maior do que a Espanha e sem saída para o mar, mas ele também é vizinho de um estado que já é um dos maiores produtores em agronegócio do Brasil, o estado de Goiás, com área de 340.086 km², quase a área da Alemanha que tem 357.592 km², e todo esse agronegócio passa por Minas Gerais para chegar a São Paulo, para exportação. E novamente, nossos formuladores de políticas de logística precisam de óculos e de bons oftalmologistas, pois sua miopia parece infinita. Um estado desse tamanho que precisa de portos e nossos planejadores logísticos ignoram isso.
Vamos aos números, considerando a distância da capital aos portos:
Localidade | Distância (Aproximada) | |
Goiânia | Porto do Rio de Janeiro | 1400 km |
Goiânia | Porto de Santos | 1000 km |
Essas distâncias são por rodovia. Com um pouco de competência, os nossos formuladores de políticas logísticas poderiam incentivar o governo de Minas Gerais a reformar estradas que permitissem melhorar o acesso à BR-040 ou LMG-815/RJ-159 com sua reforma, criando a rodovia das águas e diminuindo a distância percorrida pelos caminhoneiros de Goiás para o porto do Rio de Janeiro, gerando emprego e renda para Goiás e o nosso estado.
Mas por ferrovia, embora a distância não diminuísse tanto, poderia ser um transporte bem mais rápido. Seria interessante incentivar novas concessionárias que se interessassem em construir/restaurar trechos do que um dia foi a E.F. Oeste de Minas, chegando como no início do século ao porto de Angra dos Reis. Ou mesmo ao porto do Rio usando o traçado de Morsing.
Projetos AFTR 6 – Traçado alternativo RJ x SP (Variante de Morsing) (1)
Projetos AFTR 6 – Traçado alternativo RJ x SP (Variante de Morsing) (2)
Projetos AFTR 6 – Traçado Alternativo RJ x SP (Variante de Morsing) (Final)
Deve-se cogitar também a reativação do porto de Angra. É estranho o porto não poder funcionar por questões ambientais, mas a política de moradia e urbanização não está funcionando tão bem assim, o que pode prejudicar o meio ambiente. Qual a lógica disso?
Consideramos abaixo a cidade de Goiandira-GO que um dia já foi servida por trem e, pelo trem, seus moradores e sua carga chegavam ao Rio de Janeiro.
Localidade | Distância (Aproximada) | |
Goiandira | Porto de Angra dos Reis | 1100 km |
Essas novas concessionárias poderiam usar a câmara de compensação para a cobrança do direito de passagem, viabilizando, dessa forma, trens ligando o Rio de Janeiro a Goiás, como já ocorreu no passado. Poderiam encontrar nesses estados empresários do setor rodoviário de cargas dispostos a investir nesse segmento. A Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras, presidida pelo ex-Deputado João Leite, fracassou, entre outros motivos, por não ter se aproximado dos empresários e por ter limitado os trechos que propunha reativação a trechos apenas dentro do estado de Minas Gerais, esquecendo-se de nós, seus vizinhos com saída para o mar. Incluir na participação dessas novas empresas empresários do setor rodoviário de passageiros pode restaurar o transporte regional de passageiros por trem. Goiás não é apenas um grande produtor de Agro, mas tem diversas indústrias beneficiando esse Agro. Empresas como Heinz, Etti, Predileta, Quero, todas têm plantas industriais em Goiás.
Desconhecemos um único produto derivado de tomate vendido atualmente no Rio de Janeiro que não seja produzido em Goiás, e a pergunta é: Como esses produtos são transportados? Abaixo, mapa da E.F. Oeste de Minas no ano de 1927.
Mapa da Rede Mineira de Viação, de 1960, com a E.F. Oeste de Minas já incorporada, mostrando em parte as estações de Goiás.
Interessados em conhecer com riqueza de detalhes o traçado dessa ferrovia ligando o Rio de Janeiro a Goiás, seus ramais e suas estações, vejam a página abaixo:
http://www.estacoesferroviarias.com.br/rmv_tronco/rmv_tronco.htm
E.F. GOIÁS, UM POUCO DE SUA HISTÓRIA
A E.F. Goiás surgiu em 1906 com o objetivo de ligar algumas cidades daquele estado aos trilhos da Mogiana. Denominada inicialmente Estrada de Ferro Alto Tocantins, de capital privado, foi autorizada a explorar o trecho de Catalão a Palmas, com o objetivo de ligar a cidade de Goiás, então capital do Estado, a Cuiabá.
Outro mapa de 1954. Indo apenas até o município de Catalão
DIREITO DE PASSAGEM, O QUE É?
Considerando que nem todos os nossos leitores são versados na terminologia ferroviária, explicaremos: Direito de passagem é o valor cobrado quando uma empresa ferroviária usa a linha de outra. Como um pedágio.
Cada país regula o direito de passagem de uma forma. Em alguns países essa regulação é feita pelo estado; em outros, é feita entre as partes. Considerando o gigantismo e a ineficiência do estado brasileiro, é recomendável que aqui essa regulação seja feita entre as partes.
ANTES DE TERMINAR, UMA CURIOSIDADE
Vejam abaixo a embalagem de um macarrão instantâneo da marca Carrefour, vendido aqui no Rio de Janeiro e obviamente em todos os lugares onde existam mercados Carrefour: vejam onde ele é fabricado.

O quanto mais baratos poderiam ser esses e outros produtos fabricados naquela região e vendidos no Rio de Janeiro e São Paulo, se transportados por uma logística melhor, especificamente a ferroviária?
CONCLUSÃO
É preciso que nossos governantes entendam essa geografia normalmente ignorada. Poderíamos alavancar o desenvolvimento do nosso estado olhando para os lados e para cima e não, como atualmente, usando antolhos. Ao entenderem isso e fomentarem políticas de integração atualmente inexistentes, poderíamos fornecer equipamentos industriais para esses estados e receber suas cargas, gerando empregos para nossos cidadãos.
Tradicionalmente, sempre fomos um estado com indústrias metalomecânicas pela existência aqui da CSN fornecendo chapas. Vamos aproveitar essa característica fornecendo máquinas em troca de produtos agrícolas.
Antolhos: Peças de couro ou outro material opaco que, colocadas ao lado dos olhos de certos animais, geralmente de tração, reduzem a sua visão lateral.
OBSERVAÇÃO FINAL
Nossas ferrovias em seu início eram ferrovias mistas, hoje chamadas de Short Line, e se não fosse a intromissão dos governos tabelando frete e as descapitalizando, poderiam estar até hoje funcionando, e ter se expandido, já se perguntou o motivo de nossa malha ser tão pequena? Pensar também no transporte só de graneis é outra faceta míope dos formuladores das políticas do setor. A ferrovia mista, bem como a bitola estreita, podem ser diferenciais bem favoráveis, podem ser o futuro do setor.
Por últimos algumas informações importantes a serem referenciadas:
- A Espanha que é quase do tamanho do estado de Minas Gerais tem aproximadamente 17.000 km de ferrovias;
- A Alemanha que é quase do tamanho do estado de Goiás tem quase 40.000 km de estradas de ferro;
- O Brasil inteiro tem 31.000 km de ferrovia, boa parte inoperante.
Cada um desses países tem diversas companhias ferroviárias operando, de diversas formas e diversos tamanhos. E algumas com bitola métrica.
Obrigado RFFSA pelo monopólio, motivo de nosso fracasso.
O mais preocupante é ainda termos nos diversos níveis de governos e em instituições como ALERJ, ALESP, ALMG em comissões e se aproximando de deputados, egressos da RFFSA, além de admiradores da RFFSA, que tratam o setor com os mesmos olhos dos que destruíram o setor. Quando as pessoas em geral vão entender isso?
Agradecimentos:
– Página Centro Oeste Brasil: http://vfco.brazilia.jor.br/
– Blog Trem da Serra: https://tremdaserradoriodejaneiro.blogspot.com/
– Estações ferroviárias do Brasil: http://www.estacoesferroviarias.com.br/
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Agradecemos a leitura, e até a próxima!
Imagem de capa: imagem gerada por Inteligência Artificial
Última atualização: 14 de janeiro de 2024