INTRODUÇÃO
Ao longo dos anos, a AFTR publicou mais de 100 artigos sobre a história das ferrovias, além de alguns projetos. Em sua maioria com informações obtidas a partir de fontes primárias, e neles incluímos relatos de alguns profissionais que vivenciaram o momento.
O tempo nos mostrou que existia uma forte dicotomia entre a informação que publicávamos e o que as pessoas do outro lado já tinham escutado e acreditavam ser verdade. Mas essas pessoas acreditavam em algo sem nenhum embasamento. Não se tratava apenas de desinformação, mas de má informação, informação que muitos tinham e cujas origens eram baseadas apenas em boatos, sem nenhuma base sólida.
Chegamos, então, à conclusão de que era preciso fazer um introito, explicar o que aconteceu e por que determinadas versões predominavam. Essencialmente, prestar informações históricas sobre o princípio das ferrovias, mas também da história do Brasil, cujas histórias se entrelaçam. Informações baseadas em fontes primárias.
Sabemos que poderemos ser criticados, pois algumas dessas informações estão tão entranhadas no imaginário das pessoas que será bem difícil mostrar a nossa versão, mesmo que com fatos. Mesmo assim, resolvemos escrever este artigo e considerá-lo o número 1. Sim, passaremos a considerar este artigo como o artigo número 1, e será a partir dele que tudo acontece.
Vamos apresentar a existência de três aspectos inerentes à compreensão da história do Brasil e, por conseguinte, da história das ferrovias. São aspectos desconhecidos pela maioria, mas de vital importância para a compreensão do que efetivamente aconteceu na formação do Brasil como nação e da história da formação de nossas ferrovias. Esses aspectos entrelaçam a história das ferrovias com a história do Brasil.
Pretendemos que este texto seja usado na introdução de debates, em vídeos que pretendemos fazer e em futuros textos. Ele será sempre citado, pois esses três aspectos, como sempre, só a AFTR cita, e muitas dessas informações só a AFTR tem.
Optamos por dividir o texto completo em duas partes, a primeira é a divulgada hoje. Caso queira, navegue através do texto pelo menu de tópicos abaixo.
Sejam bem vindos, e desejamos a todos uma excelente leitura!
- PRIMEIRO ASPECTO: A FORMA COMO A HISTÓRIA É ENSINADA
- SEGUNDO ASPECTO: OS CINCO PERÍODOS DA HISTÓRIA DAS FERROVIAS
- O TRANSPORTE REGIONAL DE PASSAGEIROS

ARTIGO NÚMERO 1
OS TRÊS ASPECTOS DO QUE REALMENTE ACONTECEU COM AS FERROVIAS DO BRASIL
Texto de Mozart Rosa com colaborações do associado Bruno Hauck.
Para entender o que aconteceu com nossas ferrovias, é preciso conhecer e entender os três aspectos que envolvem a história das ferrovias e a história do Brasil. Considerando que a história das ferrovias se confunde com a história do Brasil, é preciso conhecer e entender essa história, a verdadeira história do Brasil, sempre a partir de fontes primárias. Sem entender isso, cai-se na mesmice das informações desencontradas, nas avaliações malfeitas e nas conclusões esdrúxulas.
Detalharemos abaixo, portanto, esses três aspectos:
PRIMEIRO ASPECTO: A FORMA COMO A HISTÓRIA É ENSINADA
Ferrovias fazem parte da nossa história, portanto, é preciso entender o seguinte: nossa história é atualmente ensinada de quatro maneiras distintas, e isso tem um impacto direto na compreensão do que aconteceu com as ferrovias.

A primeira maneira como a história é ensinada é a maneira criada pelos que proclamaram a República, uma maneira onde o Império e a Família Imperial são instituições menosprezadas. Personagens como Carlos Alberto Morsing, Paulo de Frontin, Cristiano Benecdito Ottoni, ou saindo da área técnica, Ernesto Carneiro Ribeiro, entre outros, que tiveram forte presença na República em seu início, mas por serem oriundos do Império, foram relegados ao esquecimento. Seus feitos, que foram muitos, foram esquecidos.

Mesmo figuras proeminentes do Império, como Antonio Clemente Pinto, o Barão de Nova Friburgo, Joaquim José de Souza Breves ou Francisco Paulo de Almeida, primeiro Barão de Guaraciaba, foram deixadas de lado. No caso do Barão de Guaraciaba, não fica bem para parte dos críticos falar dele. Afinal, ele era negro e dono de escravos.
Um dos casos mais emblemáticos dessa forma parcial de escrever a história e apagar biografias é a forma como os Irmãos Rebouças, Antonio e André, foram e são tratados e lembrados até hoje por alguns, sendo condenados ao ostracismo. Talvez pela amplitude de seus feitos, podem ser considerados dos maiores engenheiros da história do Brasil. Contudo, eles foram excluídos da história oficial escrita pelos historiadores desse período, provavelmente por serem grandes amigos da Família Imperial, tendo inclusive um deles se retirado do Brasil junto com o Imperador, por amizade e gratidão por tudo que a Família Imperial fez por eles.

Para piorar, foram condenados ao ostracismo uma segunda vez pelos historiadores pós-64, afinal eram negros, mas amigos do Imperador, e chegaram aonde chegaram por méritos próprios, algo que não coaduna com as políticas anti meritocracia dos militantes atuais e do “nós contra eles”, afinal, frequentaram a corte e foram amigos dos poderosos da época.

Ainda hoje muitos moradores do Rio de Janeiro não fazem a menor ideia de que o túnel chamado Rebouças, que corta a cidade, ligando a zona norte à zona sul e que muitos cariocas transitam por ele diariamente, ou pelo menos eventualmente, é uma homenagem aos irmãos, onde cada túnel homenageia um deles. Um túnel se chama André Rebouças e o outro, Antonio Rebouças.
Na realidade, o Período Imperial foi um período riquíssimo de nossa história e que é ensinado nas escolas de forma incompatível com a grandeza que realmente foi. Sendo as ferrovias parte integrante desse período, sua história também é ensinada de maneira incorreta. Personagens e fatos importantíssimos são menosprezados.

Todos são unânimes em falar do baile da Ilha Fiscal e falar da opulência dele, mostrando os “absurdos” do Império. Isso é uma técnica ensinada em escolas de jornalismo, isolar um fato por menor que seja e exaltar esse fato, para o bem ou para o mal, aqui nesse caso para o mal, afinal, a partir de uma única festa quiseram enterrar a imagem da Monarquia. Mas poucos falam do desastre que aconteceu com o “Encouraçado Aquidabã”, muito pior e muito mais trágico que o baile da Ilha Fiscal, e sobre o que aconteceu ali, nada nunca é falado em nenhum livro.
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A segunda maneira como a história é ensinada é a forma criada pelo DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda, de Getúlio Vargas. Alguns afirmam que Getúlio Vargas criou a indústria de base, pois tínhamos uma indústria incipiente. Interessante notar que aqueles que defendem isso não sabem definir o que é indústria de base ou o que é incipiente. E na maioria das vezes nunca entraram em uma fábrica. Tínhamos uma indústria em crescimento, as ferrovias faziam parte disso, e tudo isso foi varrido para debaixo do tapete.

Essa manipulação de nossa história, que destrói pessoas e biografias, é ruim para a real compreensão dos fatos. E citamos acima apenas alguns personagens. Poderíamos citar muitos outros, mas focaremos em um homem cuja biografia contraria os defensores de Getúlio Vargas e mostraremos o porquê: trata-se de Elói Chaves. Certamente, você nunca ouviu falar dele, mas seus pais e avós devem muito a ele.
Natural de Pindamonhangaba, tornou-se político por Jundiaí, e foi um dos maiores cafeicultores do Brasil. Fundou em 1889 o atualmente finado COMIND – Banco do Comércio e Indústria de São Paulo S.A. Em 1902, cria a Empresa Luz e Força de Jundiaí, em 1910 adquiriu a Companhia Jundiahyana de Tecidos e Cultura S/A, posteriormente rebatizada como Tecelagem São Bento. Em 1912, constituiu a Cia. Ermida de Papel e Celulose. No mesmo ano, tornou-se um dos maiores acionistas da S.A. Central Elétrica Rioclarense. Também adquiriu as Empresas Força e Luz de Mogi Mirim, Empresa Melhoramentos de Mogi-Guaçu e Companhia Luz e Força Jacutinga. Empresas que, segundo os defensores de Getúlio Vargas, não existiam, afinal tínhamos uma indústria “incipiente” antes de Getúlio Vargas.

E por fim, em 1917, seguindo de trem para a então capital do Brasil, o Rio de Janeiro, para uma sessão da Câmara de Deputados – ele era Deputado Federal por São Paulo – e conversando com um ferroviário, ouve falar da Mútua dos empregados da Estrada de Ferro Leopoldina, instituição que tem, no ano em que este artigo foi escrito (2023), mais de 124 anos, sendo a mais antiga instituição de previdência privada do Brasil. A partir dessa conversa, Elói Chaves apresenta projetos que só foram aprovados em 1923, do que viria a ser o INPS. Elói Chaves é atualmente reconhecido como o pai da Previdência Social no Brasil.

Como se pode observar, Getúlio Vargas não foi o responsável pela previdência social no Brasil. Muito antes, Elói Chaves já se preocupava com o assunto.
A terceira forma como a história é ensinada é a forma pós-1964, onde é criada a dicotomia de “nós contra eles”, ricos contra pobres, iniciando a divisão da sociedade que é tão comum atualmente. Isso cria a falácia de que os “poderosos empresários do ônibus” destruíram o setor, mas não se fala sobre os prejuízos milionários e a péssima gestão da RFFSA, entre outras falácias que não têm base na realidade.

Quem introduziu essa deturpação na historiografia brasileira, criando uma narrativa própria, foi o sociólogo Caio Prado, que nem historiador era. Ele importou vários conceitos que nada tinham ou têm a ver com a realidade brasileira – conceitos copiados do contexto saxão – e que até hoje são repetidos, mas que a maioria não sabe a origem. Esse senhor, que era o “esquerda caviar” de sua época, era de família ilustre e rica, nunca precisou trabalhar e, como normalmente acontece, virou marxista.
Esses conceitos que ele criou posteriormente tornaram-se verdades incontestes, afinal foram criados por um famoso da época. Muitas das visões que se tem hoje sobre o passado do Brasil foram criadas por ele. Caio Prado escreveu até mesmo sobre as ferrovias, mas analisou o problema vendo apenas a casca, sem entender as questões estruturais.
Todos os escritos de Caio Prado tinham um enorme viés marxista e, aliado à sua fama, conseguiram fazer algo extremamente prejudicial às gerações futuras: tirar o foco de estudo das pessoas e dos fatos para eventos utópicos. Isso prejudica enormemente o ideário das novas gerações sobre a história do Brasil. Explicando melhor: hoje, ninguém reconhece alguns personagens importantes do passado, mas conhece diversas narrativas contadas sobre eventos passados, narrativas essas bem discutíveis.
A quarta forma como a história é ensinada é considerada a mais próxima da verdade. Nos documentários da empresa “Brasil Paralelo”, personagens menosprezados pelos chamados historiadores oficiais são mostrados, bem como sua importância para a história do Brasil. Os fatos são interpretados à luz de informações primárias, algo que é ignorado por alguns “historiadores”. É por isso que a “Brasil Paralelo” é odiada na maioria das vezes por pessoas que costumam criar sua própria narrativa, muitas vezes não tendo embasamento.
Além disso a maioria dos professores de história nunca trabalhou em uma fábrica. Eles muitas vezes não consideram o que ela representa para a economia do município, do estado ou do país, e também não consideram que a empresa é uma fonte geradora de emprego e renda para a região. Sendo professores da rede pública, eles sabem que, com ou sem crise, seu salário será pago. E assim pode ocorrer de ensinarem história sob uma perspectiva ideológica, desprezando eventos que não assimilam.
Essa deturpação da história tem provocado reações em alguns professores mais sérios, como o professor Marcelo Andrade, que tem um canal no YouTube onde procura ensinar a história como ela aconteceu, fornecendo fontes primárias.
SEGUNDO ASPECTO: OS 5 PERÍODOS DA HISTÓRIA DAS FERROVIAS
Levamos nove meses para nascer, entre a concepção e o nascimento. Temos a infância, a adolescência e depois a idade adulta, períodos contínuos da vida. Nas ferrovias isso não aconteceu, alguns são períodos conflitantes, e isso nunca é mostrado.
O primeiro período começa no Império em 1854, com a inauguração dos primeiros 14,5 km da Estrada de Ferro conhecida como Estrada de Ferro Mauá. A abertura dessa estrada foi mais uma etapa importante no desenvolvimento do Brasil, pois ali se inicia a interiorização e o desenvolvimento do Brasil. Embora os Bandeirantes tenham feito a conquista, o desenvolvimento e o povoamento ocorreram graças às ferrovias. Elas foram responsáveis por parte substancial de nosso desenvolvimento econômico, com a exportação de carnes, a criação de indústrias, o desenvolvimento das cidades, e isso pouco é citado pelos chamados “especialistas”: foi um período florescente de nosso capitalismo.

Essas estradas, em sua maioria, foram criadas e operadas pelo empresariado, muitas com capital inglês. Essas informações são muitas vezes desconhecidas pela população. Muitas grandes indústrias da época possuíam ramais ferroviários e, quando construídas, eram pensadas já no uso das ferrovias. Hoje pouco se fala disso, e os ramais sumiram.
As cidades do Vale do Paraíba já existiam, mas se desenvolveram absurdamente graças às ferrovias. A maioria das indústrias daquela região tinha acesso às ferrovias por meio de ramais independentes. Chegamos a exportar automóveis, carnes e diversos outros produtos pelas ferrovias. Podemos citar alguns exemplos, como a empresa Leão Junior de chás, que ao construir uma unidade nova e maior a construiu visando uma ferrovia próxima, tendo seu próprio ramal; ou a Swift, que recentemente retomou às atividades. Nos seus primórdios, foi uma das maiores exportadoras de carnes do Brasil, e as exportava por seus ramais ferroviários, chegando a ter mais de 1000 vagões frigoríficos, dentre outros.

Outro bom exemplo é o da Companhia Frigorífica Pastoril, frigorífico fundado em 1913 na cidade de Barretos, em São Paulo, por Antonio Prado, um dos maiores acionistas da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Desse frigorífico, posteriormente rebatizado de Frigorífico Anglo em 1914, sai a primeira remessa de carnes para a Inglaterra.
A Fleischmann Royal, atualmente só Fleischmann, chegou ao Brasil em 1934 para fabricar fermento para panificação e montou uma fábrica em Petrópolis. Para a fabricação desse fermento, usava melado de cana que recebia de Campos por trem.
Os exemplos são inúmeros, um dia escreveremos só sobre o assunto. Funcionava, e muito bem, na época do “Estilo Leopoldina de ser”, posteriormente substituído pelo “Estilo EFCB de ser”, estilo mais voltado para os granéis, que com o transporte de contêineres está mudando.

A interiorização do Brasil no século XIX aconteceu graças à ferrovia, mas dois fatores adicionais nunca são mencionados: vidros e mulheres. Pouquíssimos pesquisadores e historiadores informam isso, e nós da AFTR temos essa honra de trazer essas informações. Estes dados, dentre outros, estão relatados na parte II da postagem da história de Mauá e D. Pedro II, confiram abaixo:
Em 1910, Nilo Peçanha, então presidente da República, assina o decreto nº 8077, criando a Rede de Viação Fluminense, que uniu várias ferrovias existentes no estado do Rio de Janeiro e padronizou suas bitolas para a bitola métrica. Essa informação é importante em ser fornecida, pois a partir dos questionamentos de Paulo de Frontin e Carlos Alberto Morsing – e isso está documentado – chegou-se à conclusão de que a melhor bitola para o Brasil seria a métrica, devido aos raios permitidos, principalmente na geografia mineira, e porque os custos de construção seriam muito menores do que a bitola larga.

Estamos falando de um decreto de 1910, portanto, é lamentável que, em 2022, mais de 100 anos depois, ainda se discuta isso. Mais lamentável ainda foi a construção da ferrovia do aço em bitola larga, que quebrou o país. Esperamos que um dia essa história seja apurada a contento. A guerra das bitolas faz parte desse contexto, e ninguém comenta sobre o assunto.
E nossa “mestranda favorita” dizendo que o Brasil ficou “refém” da bitola métrica poderia explicar isso melhor?
Voltando ao contexto, o segundo período começa com a Revolução de 1930 e termina com a criação da RFFSA em 1957. Aqui temos a primeira situação disruptiva no modelo ferroviário, quando um setor onde inicialmente a participação do empresário era incentivada passou para um setor onde a participação do empresário é menosprezada em benefício do estado, e Getúlio Vargas foi o responsável por isso. Ele resolveu manter a operação, pelo Estado, de ferrovias que haviam sido devolvidas ao Estado e assumiu outras. O Estado passa a ter enorme influência no setor, e isso não foi nada bom.

O Estado brasileiro começou a ter essa visão intervencionista, estatizante e estatista que tem até hoje, a partir da Proclamação da República, visão essa que foi aprofundada no governo de Getúlio Vargas. Se hoje não temos inúmeras indústrias petrolíferas, isso se deve ao monopólio criado pelo sr. Getúlio Vargas.
Apenas lembrando aos fãs de Getúlio Vargas que a Companhia Siderúrgica Mineira surgiu em 1917 e foi comprada em 1921 pelo grupo Belga ARBED, criando a Companhia Siderúrgica Belgo Mineira, muitos anos antes da fundação da CSN.

Ao longo dos anos, no período imperial, diversas ferrovias faliram e foram devolvidas ao governo. Um exemplo disso foi a E.F. Cantagalo que em 1877 foi encampada pela então província do Rio de Janeiro, mas a empresa foi vendida à Companhia Estrada de Ferro Leopoldina em 1885, uma prova do que dizemos aqui.
Algo que não aconteceu mais a partir da Proclamação da República, e foi aprofundado a partir do governo de Getúlio Vargas. Nomear correligionários sempre foi um grande negócio.
E tudo isso é varrido para debaixo do tapete!
Essa tendência estatizante que começa com a Proclamação da República fica mais evidente quando em 1920, um movimento liderado pelo então Deputado Federal pelo Rio Grande do Sul, Augusto Pestana, estatizou a VFRGS.

O terceiro período começa com a criação da RFFSA, em 1957, talvez o único período em que um complementa o outro devido à já forte presença do estado no setor. Inicialmente criada como uma empresa coordenadora das 18 empresas ferroviárias independentes nas mãos do estado, paulatinamente as foi extinguindo e/ou as incorporando.
A RFFSA se consolida no início da década de 1970 tornando-se, entretanto, uma das estatais mais ineficientes da história do Brasil. Foi durante anos a empresa com o maior número de funcionários, maior patrimônio e maior prejuízo do Brasil.
Isso nunca é comentado por nenhum “especialista” do setor, mas seus balanços são a prova disso. Balanços esses nunca lidos por tais “especialistas”. A obsessão que alguns têm pela RFFSA beira à loucura, chegamos ao ponto em que algumas pessoas disseram que tais balanços foram “falsificados” ou “maquiados”. 😳
A RFFSA pode ser comparada à Indian Railways, considerada antes e hoje a mais ineficiente estatal do planeta, empresa que tem atualmente mais de um milhão de funcionários. Segundo alguns, ela é a responsável direta pelas desigualdades sociais da Índia, que a subsidia através de impostos.

Uma das maiores mentiras vendidas aos Brasileiros, como forma de ludibriá-los e gerar cada vez mais estatais e cada vez mais contratos de obras de infraestrutura, foi a de que os empresários eram incapazes de investir.
Eles não investiam não por serem incapazes, eles não investiam por serem IMPEDIDOS de investir, por existirem, como no setor ferroviário, instrumentos jurídicos como o do monopólio que impedia investimento privado.
Aos interessados, pesquisem a CBA – Companhia Brasileira de Alumínio, do grupo Votorantim que, para ser viabilizada, foi construída uma usina hidrelétrica às custas do próprio grupo, além de diversas hidrelétricas construídas pelo Brasil com capital privado, e isso também é varrido para debaixo do tapete, mais uma informação histórica omitida. Aparentemente, o objetivo é enaltecer as realizações do estado. Postura mais soviética do que isso, impossível.
No caso do setor ferroviário, muita desinformação foi propagada por funcionários da RFFSA, visando manter seus privilégios.
O quarto período foi nos governos Lula e Dilma. Após as concessões que precisavam ser feitas de alguma forma, no governo FHC, várias medidas complementares que deveriam ter sido tomadas em seguida não as foram, pelos governos Lula e Dilma, e que acabaram por deixar o setor abandonado, moribundo. A RFFSA foi desmantelada e um vácuo foi criado, nada foi criado para substituí-la. Não falamos de uma nova empresa similar à anterior, que certamente teria os mesmos vícios e defeitos. Entretanto foram criados no DNIT e na ANTT setores ferroviários, mas ocupados por profissionais oriundos das rodovias, ou ex-funcionários de carreira da RFFSA, aquela empresa que virou um cabide de empregos e que nunca deu lucros, com a maior parte de seu quadro acreditando em diversas Teorias da Conspiração, sobre as quais ainda publicaremos um texto exclusivo.

Entre as teorias, fala-se até hoje que os empresários do ônibus foram os responsáveis pelo fim de diversos serviços ferroviários, e que o transporte de passageiros por ferrovias não é lucrativo, uma incongruência total se for generalizada. São teorias criadas pelos “especialistas” da época, que permanecem vivas até hoje, e teorias apoiadas pelos então funcionários da RFFSA, incapazes de assumir os problemas da companhia em que trabalhavam. Considerando que ferrovia, em sua origem, era e é um negócio que essencialmente tem que dar lucro, já tivemos gerenciando esse setor pessoas que não faziam a menor ideia do que fosse isso.
Foi um período obscuro, pois as pessoas mais improváveis eram nomeadas para gerenciar o setor. Esse é um fator jamais comentado por quem diz entender do assunto. Certamente, esse deve ter sido o pior período pelo qual passou o setor em toda a sua história.
Sobre as privatizações, abaixo gráfico tirado do estudo do BNDES, chamado “Ferrovias de Cargas Brasileiras: Uma Análise Setorial”, página 9, mostrando a redução significativa no número dos acidentes ferroviários pós-privatização em considerável período de tempo.

Essa situação de incapacidade das gestões respingou muito aqui em nosso estado, e poucos se dão conta. A Central Logística, empresa estadual que deveria fazer estudos de mobilidade ao longo dos últimos anos, tem tido em sua direção e quadros as pessoas mais improváveis, menos profissionais da área ferroviária (salvo poucas exceções), que é o que interessa. Um exemplo é o projeto “Metrô de Macaé”, onde o quadro funcional da Central Logística assessorou a prefeitura de Macaé… e o projeto tem mais de uma década de iniciado e até hoje não foi nem de longe concluído ou implementado.

O quinto período estamos vivenciando agora no atual governo, mas apenas com o passar dos anos será reconhecido. A aprovação de um novo marco regulatório ferroviário, efetuada pelo governo Bolsonaro, está fazendo com que as empresas alijadas da construção de novas ferrovias, durante mais de 80 anos, novamente se interessem em construir e operar ferrovias. Está se retomando a prática vitoriosa existente no início do século XX, onde indústrias se associam a empresas construtoras para a construção de ferrovias, ou bancam essa construção. Isso tende a ser algo bem-sucedido, mas vai levar tempo para efetivamente acontecer, ferrovia não se constrói em meses e sim em anos. Mas a tendência é que aconteça, acreditem.
(Atualização de última hora: esse texto foi escrito em 2022, e estamos em 2023. O atual ministro dos Transportes declarou recentemente que pretende “rever” o marco regulatório, proposto ainda por José Serra há vários anos e aprovado no governo anterior. Falta saber se em benefício ou prejuízo da medida, e o que vai sair disso só Deus sabe. Contudo, o marco é aparentemente satisfatório e direciona para o empresário a responsabilidade pela construção das ferrovias. O que acontecerá agora e daqui por diante, veremos, ninguém sabe).
E O TRANSPORTE REGIONAL DE PASSAGEIROS?
Sobre o Transporte Regional de Passageiros, as perspectivas não são boas. Infelizmente, alguns “especialistas” com boa divulgação na mídia e bons contatos no governo não procuram empresários do setor rodoviário para participar desse setor. Sendo assim, o Transporte Regional de Passageiros dificilmente irá acontecer, mas a esperança é a última que morre. Muito barulho até está sendo feito, mas sem ações efetivas e sem a participação daqueles que realmente entendem desse assunto, que é o “transporte de passageiros”, nada acontecerá. E esses empresários, ao longo do tempo, por conta dessas Teorias da Conspiração infundadas, têm sido tratados como vilões.
A AFTR já publicou diversos textos sobre o tema, mas um especificamente recomendamos a leitura, no link abaixo:
O texto que está sendo lido foi escrito a partir do contato de membros da AFTR com a ANP Trilhos. Observem no manifesto produzido por essa instituição, que publicamos abaixo, como se afirma sendo defensora da volta do trem regional de passageiros (e não duvidamos), mas ao mesmo tempo não existe nenhuma ligação ou contato com empresários do transporte rodoviário de passageiros, fica tudo sempre entre governos em várias esferas. Esses empresários, consultados pela AFTR, já demonstraram interesse no assunto, considerando que seus passageiros não ficariam parados em engarrafamentos, seus custos operacionais seriam menores pelo fato de não terem gastos com pneus e suspensão, dentre outros custos (cada modal tem os seus em particular), isso tudo sem falar nos veículos fabricados para essa função pela Bom Sinal e pela Marcopolo, que podem transportar pelo menos o dobro de passageiros do que o ônibus comum.

A AENFER também faz parte da relação de instituições que apoiam o trem de passageiros. Apoiar em si muitos e nós mesmo somos capazes, mas a questão é: o que efetivamente a AENFER é capaz de acrescentar a esse movimento, além de dar apoio? Com todo respeito à instituição da qual alguns membros já fizeram parte, a AENFER (Associação dos Engenheiros Ferroviários, antiga Associação dos Engenheiros da Central do Brasil) é constituída em sua maioria por engenheiros aposentados que trabalharam naquela empresa monstruosa que nunca deu lucros, chamada RFFSA. Além do apoio, o que se precisa e essas pessoas podem fazer a mais por esse movimento?

Pessoas do governo e ativistas do setor ainda acreditam nesses boatos envolvendo empresários do setor rodoviário, mas esquecem que tais empresários ganham dinheiro transportando pessoas, seja onde e como for, inclusive pelas ferrovias, se assim forem incentivados, como citamos várias vezes.
Apenas lembrando que o Grupo Guanabara Diesel – fundado e de propriedade do Sr. Jacob Barata, um dos maiores empresários do setor de transporte de passageiros do Brasil – em 1998, participou do leilão da Flumitrens que posteriormente na privatização veio a ser a Supervia. E não foi para extinguir e asfaltar as linhas, foi para operar a Flumitrens de uma maneira mais profissional e investir nela, que segundo reportagens de jornais da época, transportava poucos passageiros por ser uma empresa, na ocasião, sucateada e que, com investimentos, poderia multiplicar o número de passageiros transportados e ser lucrativa.

Sim, quem tem menos de 40 anos e vive reclamando da Supervia, querendo a volta da RFFSA ou da CBTU, saiba que os índices de paradas e de acidentes hoje, apesar de existirem, são bem menores do que quando o sistema era operado por essas estatais. As composições eram sucateadas e não existia ar-condicionado. Além disso, que a Supervia hoje vive uma crise, isso não tenham dúvidas, mas apresenta um serviço muito melhor do que as empresas estatais prestavam.
Por hoje terminamos por aqui, mas aguardem e acompanhem a segunda parte deste texto, em breve!
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Agradecemos a leitura e até a próxima!
As opiniões constantes deste texto podem não ser, total ou parcialmente, a opinião da instituição.
Imagem em destaque: pátio de Visconde de Itaboraí em 2010. Foto: Daddo Moreira
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