Dando sequência aos nossos artigos numerados, publicamos mais um de extrema importância. Responderemos aqui à pergunta feita por 10 entre 10 pessoas amantes das ferrovias, pergunta essa respondida, em sua maioria, de forma passional e incorreta.
Apresentamos diversos fatos, na maioria das vezes com comprovação, sobre o que efetivamente aconteceu, e com uma leitura crítica.
Abordamos aspectos históricos ignorados ou desconhecidos pela maioria.
Certamente isso incomodara muitas pessoas que criaram uma narrativa própria, mas nosso objetivo é esclarecer.
Obrigado pela leitura.
ARTIGO NÚMERO 5
QUEM EFETIVAMENTE ACABOU COM AS FERROVIAS NO BRASIL?
RESPOSTA: A RFFSA
Aceitem que dói menos, mas a resposta para essa pergunta é simples e direta. A verdadeira responsável pela extinção de diversos serviços e diversos trechos ferroviários espalhados pelo Brasil, diferente do que as Teorias da Conspiração dizem, e aquele tiozão do churrasco conta com ares de superioridade, foi a RFFSA.
Aquela empresa admirada por muitos, que seus ex-funcionários com orgulho dizem ter feito parte da história do Brasil e blá, blá, blá.
Essa empresa foi a verdadeira responsável por hoje não termos um transporte regional de passageiros, e por termos uma malha ferroviária tão incipiente.
Simples assim, os fatos e documentos comprovam isso.
É muito cômodo para demonstrar superioridade intelectual, falar da “corrupção” e dos “políticos corrutos”, essa é uma forma rasa de ver a coisa, mostra desconhecimento total da situação, de seus aspectos históricos, econômicos e administrativos.
RFFSA — SUA HERANÇA MALDITA
A RFFSA foi uma empresa que já nasceu quebrada, por conta da herança maldita criada no governo de Getúlio Vargas, e que ela ao ser criada absorveu:
- Início da intervenção explícita do estado no setor.
- Congelamento de tarifas que sobrou até para os bondes.
Duvidamos que qualquer defensor ferrenho da RFFSA, ou qualquer ex-funcionário tenha lido algum balanço publicado por essa empresa, para defendê-la como defendem. Ignoram os colossais prejuízos que ela tinha.
E como boa estatal dava a seus funcionários mordomias impensáveis nas empresas privadas, e claro que por isso é endeusada pelos ex-funcionários.
Querem exemplos?
Podemos falar dos ferroviários de Santos Dumont que vinham para o Rio de Janeiro de litorina a sua disposição para compras e tratamento médico.
Da manutenção dos imóveis ocupados por funcionários, onde a RFFSA trocava até lâmpadas queimadas, além de providenciar reformas.
Do prédio monstruoso construído para sua sede tendo a disposição o da Central do Brasil.
Esses são só alguns exemplos, poderíamos citar inúmeros.
A função social que cobrava preços subsidiados da passagem subsídio que a própria RFFSA, bancava, da qual muitos se orgulham de ter ajudado a implantar, que ajudou a quebrar a empresa, e pouco ou nada acrescentou.
Mostramos na postagem de Gloria Maria um desses exemplos fracassados de “Tarifa Social”
Isso gerou uma situação de caixa calamitosa que impedia a empresa de realizar os investimentos necessários deixando alguns ramais ao leu.
Antes não existiam câmeras em celulares, e nem celulares, e não existiam redes sociais, as lambanças não eram documentadas e publicadas como são hoje, as pessoas não sabiam o que estava acontecendo, a informação não era descentralizada como hoje, tudo era controlado pela grande imprensa, e ela publicava o que era conveniente para ela.
A forma burlesca como a RFFSA, era administrada só aparecia eventualmente na grande imprensa.
Observem abaixo um recorte de jornal de 1960, ano das eleições presidenciais que elegeram Jânio Quadros e a pergunta feita aos diversos candidatos.
Com todo respeito aos ex-funcionários e especialmente aos antigos maquinistas, que representam um enorme contingente de ex-funcionários, o que efetivamente, além da sua compreensão notória sobre a operação das máquinas, esses senhores entendem efetivamente do setor? A maioria que defende a RFFSA com unhas e dentes deveria falar que defendem não a empresa que controlava o setor e que era sua empregadora, mas defendem as mordomias que tinham.
Caso o leitor tenha interesse em mais informações sobre o assunto, recomendamos a leitura de nossa postagem abaixo:
Impressiona, ou diríamos, desveladamente assusta, a existência de trabalhos de TCC ou teses de mestrado, ou doutorado que, ao tentar explicar o desastre ferroviário brasileiro, ignorem os balanços e os monumentais prejuízos da RFFSA. Tais documentos são públicos e são simplesmente ignorados. Nossa mestranda favorita escreveu um trabalho que consideramos o hors concours da mediocridade, é um trabalho tão ruim que não serve nem para uso sanitário pelo fato do papel em que é impresso ser muito grosso, outro trabalho que nos chamou a atenção de forma bem ruim, foi um TCC feito por uma formanda aqui do Rio de Janeiro que vinculou a destruição do trecho da E.F. Cantagalo em Cachoeiras de Macacu ao Regime Militar. Ignora todo o contexto da RFFSA, um TCC que era um lixo do início ao fim. Objetivo claro de criar uma narrativa onde coubesse o regime militar, apenas isso.
Mas menção honrosa seja dada aos formandos da UFOP-UniversidadeFederal de Ouro Preto, e da UFJF — Universidade Federal de Juiz de Fora que quando falam da história das ferrovias em solo mineiro e dos problemas econômicos que a sua destruição causou, costumam fazer trabalhos primorosos, a eles os nossos parabéns.
RFFSA — O MESSIANISMO, COMO É TRATADO, E O MONOPÓLIO
A forma quase messiânica como alguns defendem a RFFSA, lembra um episódio lamentável da história humana, o nazismo e o cumprimento de ordens, que dizimou diversas populações.
É um pouco assustador e muitos vão nos criticar, mas para entender melhor isso, falaremos do direito positivo. Alguém sabe o que é isso?
Diferente do direito natural, sendo algo inerente ao homem, e que já nasce com ele como o direito à vida, forma do direito existente até o início do século, o direito positivo para existir depende de leis, sendo garantido pelas autoridades, leis essas nem sempre coerentes e justas, essa corrente jurídica ganhou força a partir do início do século com os positivistas, e Hitler mostrou o fracasso que é o direito positivo ao exterminar os judeus, mas ele ao fazer isso estava “cumprindo a lei”.
Perguntem a um advogado com mais idade, melhores explicações sobre isso, somos engenheiros e não somos qualificados para explicar detalhadamente esse assunto.
No Julgamento de Nuremberg esse foi o principal argumento de defesa de muitos julgados, eles “Estavam cumprindo a lei”.
Abaixo vídeo do professor Marcelo Andrade sobre o tema.
Ao impedir a entrada de novas empresas no setor evocando o monopólio, estagnando o setor, os funcionários da RFFSA, estavam apenas cumprindo a lei.
Ao extinguir linhas especificamente as da E.F. Leopoldina, que mesmo com potencial lucrativo, não recebiam investimentos por conta da Guerra das Bitolas, os funcionários estavam apenas cumprindo a lei.
Ao impor as tarifas sociais, que aumentavam o prejuízo da RFFSA, os funcionários estavam apenas cumprindo a lei.
E assim nosso setor ferroviário foi para o vinagre, e decaiu absurdamente, afinal seus gestores exclusivos os funcionários da RFFSA, “estavam apenas cumprindo a lei”.
E assim defendendo a RFFSA, as lendas surgiram, afinal não se podia reconhecer o erro, era preciso jogar a culpa nas costas de alguém. O empresário do setor rodoviário foi o vilão perfeito. E assim o estrago foi feito, aqueles que poderiam ser a solução do problema viraram os “responsáveis” pelo problema.
Incapazes de entender o problema e reconhecer a origem do problema, aqueles que criaram essas lendas se apegam a elas exageradamente,criando detalhes inexistentes.
Convidamos a todos, lerem nossa postagem sobre Teorias da Conspiração. Alguém duvida que algumas delas tenham sido incentivadas por ex-funcionários da RFFSA?
Artigo 3: as Teorias da Conspiração e ideias sem sentido (parte 1)
Artigo 3: as Teorias da Conspiração e ideias sem sentido (parte 2)
Como dizem alguns, quem tem limite é cartão de crédito, brasileiro não, bizarrice criada por alguns é coisa de brasileiro e não tem limite. Descobrimos acidentalmente Marty McFly do filme de Volta Para o Futuro vivendo aqui no Rio de Janeiro.
AÇÕES SEM SENTIDO GERANDO MAIS PREJUÍZOS
A forma como alguns trechos foram alargados foi criminosa. Tudo para desmerecer a bitola métrica.
O alargamento da Estrada de Ferro Araraquara promovido em 1952 pelo então governador de São Paulo Lucas Nogueira Garcez, foi absurda, o que isso representou em custo para o caixa do estado de São Paulo, é algo imensurável, e o pior, existem vídeos onde esse governador fala que com isso as ferrovias paulistas estavam sendo “modernizadas”.
Trechos como o da Leopoldina a Gramacho, que funcionavam muito bem, obrigado, foram alargados para fazer valer informações prestadas por engenheiros mais preocupados com sua própria posição em busca de uma pretensa “modernidade”.
Quanto isso custou a empresa?
Trechos que poderiam estar funcionando muito bem com a bitola métrica.
Esse dinheiro poderia ter sido usado na modernização do trecho de Petrópolis e na construção de oficinas para equipamentos da bitola métrica em Gramacho ou Saracuruna, INEXISTENTES ATÉ HOJE. A Supervia para fazer manutenção dos equipamentos usados nesse trecho, precisa levá-los em cima de caminhões para Deodoro, ou outros lugares. As locomotivas são normalmente encaminhadas para Minas Gerais ou Santa Catarina.
Quem foi o responsável por isso?
O nome não sabemos, mas não foi nenhum empresário do ônibus, certamente foi algum funcionário da RFFSA.
Abaixo recorte de página do jornal Tribuna da Imprensa de 11.04.1981, tudo o que fala-se sobre a RFFSA está ali dito por seu presidente da época.
A própria RFFSA reconhecia seus prejuízos, mas pouco, ou nada, fez para diminuí-los.
Tem algo que precisa ser dito a todos que criticam a extinção da malha da Leopoldina. Além da Guerra das Bitolas, citada por nós, inúmeras vezes esse desconhecimento acaba criando inúmeras teorias sem fundamento. Como já mostramos aqui neste mesmo texto, falar da “corrupção”, dos “políticos corruptos”ou dos empresários do ônibus é um exemplo disso, mas é bem cômodo e dá a quem fala uma aura de conhecimento que na realidade não existe.
ALGUMAS CURIOSIDADES SOBRE A RFFSA E SOBRE AS FERROVIAS
Aqui contaremos apenas duas, mas o leque de bizarrices envolvendo a RFFSA é enorme, talvez um dia nos dediquemos ao assunto.
E.F. Teresópolis.
Embora seja creditada a E.F. Príncipe do Grão-Pará, a ferrovia que ligou (e que dependendo de nossa vontade voltará a ligar) O Rio de Janeiro a Petrópolis, ser a primeira ferrovia do Brasil essa informação não é de todo correta, o trecho inicialmente inaugurado ligava Guia de Pacobaíba a Piabeta, levando mais alguns anos para a subida da serra. Quando de sua inauguração, ainda não existia tecnologia para essa subida, até então existia apenas a adesão direta, inviável na declividade da ligação com Petrópolis. O que existia na Inglaterra para essas situações era o nascente sistema funicular, implantadono Brasil em Paranapiacaba.
A primeira ferrovia do Brasil a subir uma serra foi a E.F. Cantagalo usando o sistema“Fell”, o sistema de Cremalheiras “Riggenbach” só seria inventado bem posteriormente e usado pela primeira vez no Brasil para subir a serra de Petrópolis.

Em 1894, foi construída a E.F. Teresópolis já usando o sistema de Cremalheiras Riggenbach. A E.F. Teresópolis, já sob administração da RFFSA foi extinta em 1957.

A pergunta que não quer calar é: assim como as estruturas de aço de enorme valor histórico, construídas nas oficinas do Sr. Eiffel, o mesmo da torre, que davam sustentação a um galpão nas oficinas do Engenho de Dentro, e que sumiram, ninguém sabe, ninguém viu, onde foram parar as cremalheiras dessa ferrovia, que foram prometidas para uso da E.F. Cantagalo, com a desativação da E.F. Teresópolis?
Abaixo, postagem Trilhos do Rio sobre o tema:
A Ferrovia e suas histórias desconhecidas VI Final – Oficinas do Trajano e a Torre Eiffel
Alguém tem ideia de quanto custa apenas um km de cremalheiras Riggenbach? A única empresa no mundo a fabricar tanto as cremalheiras como as locomotivas que vão rodar nelas é a Stadler, fábrica de locomotivas suíça. A E.F. Teresópolis tinha muito mais do que um km.
https://stadlerrail.com/en/products/
Savio Neves presidente da E.F. Corcovado, provavelmente o maior especialista brasileiro em Cremalheiras Riggenbach, ao comprar novos veículos para aumento de capacidade de passageiros da E.F. Corcovado viajou o mundo inteiro em busca de alternativas e acabou comprando os veículos da Stadler, a quarta geração de veículos dessa mesma empresa, mais de 100 anos fornecendo veículos para a E.F. Corcovado, simplesmente por essa empresa ter conseguido dominar essa tecnologia e ser a única empresa do mundo a fabricar esse sistema.
As Cremalheiras e as engrenagens que vão rodar nas linhas e nos veículos, são fabricadas em aços especiais, com tratamento térmico específico para suportar com segurança as inúmeras tensões a que vão ser submetias e é algo com enorme valor de mercado mesmo usadas tendo em vista a qualidade como foram fabricadas e SUMIRAM.
Temos relatos de que existem espalhados pelo Rio de Janeiro pedaços dessas cremalheiras, quanta irresponsabilidade dos funcionários da RFFSA da época. Quanto isso custou e depois foi tratado como sucata?
Mais um pouco da história da E.F. Teresópolis, produzida pelo Blog Trem da Serra.
https://tremdaserradoriodejaneiro.blogspot.com/2019/10/estrada-de-ferro-teresopolis-da.html
PÓRTICOS
Alguém já viu um ou sabe o que é? Pórticos são equipamentos usados para mover, por exemplo, contêiner de um lado para o outro. O TSG — Terminal São Geraldo, atualmente operado pela MRS Logística, construído às margens da Rodovia Presidente Dutra, 10.501, tem uma série deles para colocar as cargas, especialmente os contêineres dos vagões prancha nos caminhões. É uma operação rápida e precisa.

O autor desse texto dimensionou os acionamentos de todos eles.
Aqueles com maior capacidade de observação devem ter percebido que os motivos mencionados em textos diversos para extinção de algumas linhas em bitola métrica teriam sido “o custo elevado” do translado das cargas transportadas em ferrovias de bitola métrica para ferrovias em bitola larga. Os responsáveis pela logística da RFFSA nunca ouviram falar em pórticos? Era tudo descarregado na mão? aquele povo nunca ouviu falar também em guindastes?
Apenas uma observação sobre o TSG. O desconhecimento de funcionários do estado sobre o setor é tão gritante que pagaram um projeto o Pavuna Arco que invade uma faixa de domínio federal medida obviamente passível de ser contestada na justiça, faixa de domínio essa atualmente operada pela MRS Logística que além de alimentar com cargas o porto do Rio alimenta com cargas o TSG.
Projetos inadequados e suas aplicações equivocadas 2 – Pavuna x Arco Metropolitano
AS CONCESSÕES
As concessões poderiam ter sido um ótimo instrumento para expandir o modal ferroviário, mas quem fez os contratos de concessão na gestão de FHC foram ex-funcionários da RFFSA, pessoas que deveriam explicar o que fizeram em uma empresa como aquela. Pessoas sem nenhum conhecimento de lucro. Pessoas que desconhecem o significado da palavra mercado. Enfiaram clausulas desnecessárias nos contratos, que amarraram e muito as empresas que compraram essas concessões, a MRS não pode investir na conclusão da Ferrovia do Aço, a VLI não podia repassar trechos que não tinha interesse para outras empresas, essas empresas para os pseudo entendidos em ferrovias, viraram vilãs, essas mesmas pessoas que além de nunca terem lido um balanço da RFFSA, nunca leram esses contratos de concessão.
Para piorar, no governo Lula, posterior ao de FHC, ele ignorou a existência de ferrovias, e as pessoas nomeadas para a gestão do setor eram as mais improváveis.
Muitos deles, economistas.
Aqui mais um caso para os psiquiatras estudarem. Lembra a piada da esposa de malandro que, mesmo sofrendo, não deixa o marido. Algumas daquelas pessoas que dizem defender as ferrovias, e reclamam do descaso dos governos com o setor, são as mesmas que admiram presidentes omissos, em um ou mais mandatos, negligenciando o setor e o ignorando, nomeando as pessoas mais improváveis para administrá-lo, além de nutrirem enorme admiração pelos mesmo presidentes e votarem periodicamente em partidos que não melhoraram, nem melhoram, em nada o setor.
Não deixem de ler a parte final deste artigo!
Agradecemos a quem chegou até aqui!
Gostou? Curtiu? |
Agradecemos a leitura, até a próxima! |
O conteúdo deste artigo pode refletir, ou não, a opinião da instituição, sendo de inteira responsabilidade de seu autor. |
Texto escrito em 11 de julho de 2024 às 20h03
Última atualização em 11 de julho de 2024 às 20h03
Imagem de capa: Locomotiva GM SD38M no.5117 no pátio da estação Marítima em 1993 / Acervo Benício Guimarães / AENFER